Título: 'Operação demissão' no ar
Autor: Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 11/04/2007, Economia, p. 19

Controladores de vôo ameaçam pedir baixa coletiva para pressionar por desmilitarização.

Após duas semanas do motim que parou o transporte aéreo de passageiros no país, parte dos controladores de vôo militares sediados no centro de controle Cindacta 1, em Brasília, articula uma reação, caso se confirme a interrupção do diálogo com o governo para desmilitarizar o tráfego aéreo. Ontem, profissionais se reuniram por quase quatro horas em uma chácara nos arredores de Brasília, em assembléia extraordinária convocada pela Associação Brasileira dos Controladores de Tráfego Aéreo (ABCTA). Em avaliação preliminar, uma ferramenta de pressão que os profissionais ameaçam usar é o pedido coletivo de baixa.

Fontes presentes ao encontro disseram ao GLOBO que, somente em Brasília, 123 sargentos estariam dispostos a pedir o desligamento da Força Aérea Brasileira (FAB) - quase metade dos cerca de 260 controladores do Cindacta 1 -, dos quais 40 já estariam decididos. O número pode crescer, disse um dos líderes do movimento, pois graduados das outras sedes de controle de tráfego (Curitiba, Recife e Manaus) estão sendo convocados.

Um processo de desligamento demora cerca de 45 dias, e o raciocínio é que os controladores poderão prestar um concurso público no futuro e ingressar numa nova estrutura civil. O problema é que uma medida dessas poderá desfalcar ainda mais o quadro de profissionais e levar a um novo apagão aéreo.

Para se ter uma idéia, só a falta ao trabalho de dois controladores do Cindacta 4 (Manaus) em um turno, na véspera da paralisação de 30 de março, foi suficiente para segurar em solo 25 aviões, inclusive estrangeiros.

Nova greve está descartada, por ora

A assembléia teve também o objetivo de acalmar os ânimos de um grupo de sargentos revoltados pela forma como o governo conduziu o processo, centralizando todas as decisões nas mãos da Aeronáutica - inclusive a punição dos rebelados.

A avaliação do grupo, contou um líder, é que a categoria tem que continuar unida e traçar novos rumos para pressionar o governo, além de chamar a atenção da sociedade para os problemas do setor. Eles discutem, por exemplo, o que poderá ser feito se as transferências punitivas não forem canceladas, como a do diretor de Mobilização da ABCTA, Edleuzo Souza Cavalcanti, de Brasília para Santa Maria (RS) - que deflagrou a greve no dia 30 de março.

Uma nova greve e o aumento do espaço entre os aviões, por ora, estão descartados pelo movimento. Mas os controladores alertam que novos problemas poderão surgir em função de falhas nos equipamentos. Segundo um dos participantes do encontro, há um entendimento de que é necessário melhorar a imagem do profissional junto à opinião pública, e buscar o apoio da sociedade civil organizada.

Apesar de os controladores terem pedido perdão à sociedade publicamente pelos transtornos causados com a greve, uma parte deles não engoliu o recuo do governo, que rasgou o acordo feito com os rebelados na noite da paralisação. Para restabelecer o tráfego, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, em nome do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, garantiu que não haveria punições. Bernardo assegurou ainda a abertura de negociações para desmilitarizar o setor e criar uma gratificação.

Quarto IPM é aberto. Pane atinge a TAM

Dois dias depois, o ministro foi desautorizado, e o governo disse que teria garantido a suspensão apenas das punições administrativas. Lula deu carta branca à Aeronáutica para instaurar Inquéritos Policiais Militares (IPMs) e punir os rebelados, inclusive com expulsão da Força e prisão em cadeia comum. O Comando da Aeronáutica abriu quatro IPMs - o último foi anunciado ontem e será instaurado em relação aos controladores do aeroporto Tom Jobim. Outros dois IPMs já estão em andamento nos Cindactas 1 (Brasília) e 2 (Curitiba). Um terceiro começará no Cindacta 4 (Manaus).

Além de recuar, o presidente chamou os controladores de irresponsáveis. O governo disse que não negociaria com "a faca no pescoço" e que esperava uma resposta da categoria durante o feriado da Páscoa, para dar andamento às discussões. Os controladores aguardavam do Planejamento um cronograma de ações para discutir o tema a partir de hoje, mas o encontro foi cancelado.

- Eles querem um cronograma para implementar as mudanças - disse um dos líderes.

Na tentativa de ganhar apoio da sociedade, um grupo de controladores se reuniu ontem com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A entidade concordou em interceder diretamente junto ao governo.

O azar continuou rondando ontem os aeroportos do país. Uma pane no sistema eletrônico de check-in da TAM obrigou a companhia a emitir manualmente os bilhetes de embarque de vôos de todo o país durante uma hora e 15 minutos. O sistema falhou das 16h10m às 17h25m. A TAM garantiu que o problema não causou atrasos imediatos. Segundo a Infraero, 127 (8,5%) dos 1.492 vôos programados nos principais aeroportos até as 19h tiveram atrasos superiores a uma hora e 39 foram cancelados.

COLABORARAM Ramona Ordoñez e Erica Ribeiro