Título: Casa da incerteza
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 12/04/2007, O Globo, p. 2

No primeiro mandato, o Senado foi o purgatório político do governo Lula. A base governista minoritária e a bancada inexperiente do PT penaram diante de uma oposição articulada e implacável no trato dos escândalos petistas. Foram três CPIs e muitas derrotas. Nesta legislatura, a correlação de forças pouco mudou. O ambiente é que estava melhor, mas começou a ficar pesado. Uma CPI do Apagão Aéreo no Senado seria incontrolável. Ali também não será fácil aprovar a CPMF e a DRU.

A oposição tem 31 cadeiras no Senado, mas o governo não controla as outras 50. Apoio certo, tem só de uns 45. Os demais funcionam como pêndulo, sensíveis aos afagos do governo. A prorrogação da CPMF e da DRU exigirá o quórum qualificado de três quintos (emendas constitucionais), ou 49 votos. O governo vai precisar, e muito, da boa vontade da oposição.

Diante da demora do STF em autorizar a instalação da CPI do setor aéreo na Câmara, a bancada do DEM quer instalar uma outra no Senado. Número de assinaturas para isso a oposição tem. Os senadores tucanos eram contra, mas ontem toparam o desafio. Foi uma reação à instalação da CPI da Nossa Caixa na Assembléia Legislativa paulista, mirando no ex-governador Geraldo Alckmin.

Os governistas acham que a CPI do Senado não sai. Garantem que alguns senadores da oposição estão falando grosso mas não querem saber de CPI do setor aéreo. Teriam suas próprias razões passadas. Seja como for, o ambiente no Senado começou a ficar envenenado, admite o senador petista Tião Viana. Isso foi dito ontem ao ministro da Coordenação Política, Walfrido dos Mares Guia, que se reuniu com a bancada petista e vai se encontrar com as de outros partidos. Um progresso, diz a senadora Ideli Salvatti, "pois, mesmo quando os ministros eram petistas, não merecíamos atenção". E a falta de atenção ao Senado contribuiu muito para torná-lo tão hostil.

Há outros problemas. Renan Calheiros ainda está magoado com o presidente Lula porque este não apoiou a candidatura de Nelson Jobim à presidência do PMDB. Há a disputa surda entre Senado e Câmara pela iniciativa legislativa. Cada Casa tem feito sua pirraça, deixando fora de pauta matérias oriundas da outra. Não bastasse, estão péssimas as relações entre Arlindo Chinaglia e Renan, que apoiou a candidatura de Aldo Rebelo para presidente da Câmara. Arlindo teria deixado até de atender os telefonemas de Renan. E há, por fim, a disputa por cargos no segundo escalão, que também se reflete no Senado.

Desta vez, pelo menos, o governo parece estar enxergando o problema. Mares Guia está agindo e o próprio Lula tem buscado diálogo com os senadores da oposição. Ontem o senador Antonio Carlos Magalhães ainda falava com satisfação de seu encontro com o presidente. Agora Lula quer muito conversar com Tasso Jereissati, presidente do PSDB. Seus assessores dizem que ele vai, se o convite for oficial e o tema, de interesse público. Lula parece tê-lo encontrado na conversa de anteontem com Sarney, que foi ao Planalto defender o projeto das ZPEs, que tramita no Senado. Em seu governo, diz ele, as ZPES foram boicotadas por São Paulo. "Se tivessem sido implantadas, o Brasil seria hoje uma China". Lula aproveitou a deixa para propor uma conversa com senadores sobre ZPES. Entre eles, Jereissati.

Se agir a tempo, o governo pode evitar a deterioração política no Senado. Se evitar a CPI ali, com sua maioria poderá controlar a da Câmara, onde a oposição corre o risco de derreter.