Título: Preços ajudaram a reduzir desigualdade
Autor: Melo, Liana
Fonte: O Globo, 12/04/2007, Economia, p. 29

Inflação menor para famílias de baixa renda fez aumentar seu poder de compra.

O comportamento da inflação na última década - quando os produtos que compõem a cesta das famílias mais pobres subiram sistematicamente menos do que os demais - fez a desigualdade no Brasil cair mais do que as estatísticas mostram à primeira vista. Em artigo a ser lançado amanhã, dois pesquisadores calcularam o Índice de Gini (que mede a desigualdade de renda) ajustado pelo poder de compra das famílias. Eles concluíram que, entre 1995 e 2005, a redução no que eles chamaram de "desigualdade do bem-estar" foi maior do que a melhora verificada na distribuição de renda.

Considerando apenas o rendimento, o Índice de Gini do Brasil recuou de 59,85% para 56,66% nesse período (quanto mais perto de 100%, pior). Mas, ao levar-se em conta que a inflação foi menor para as famílias de baixa renda - que, por isso, viram aumentar seu poder de compra - esse mesmo Índice de Gini, ajustado, tem queda maior: de 59,85% para 56,05%. Uma diferença de 0,6 ponto percentual. O estudo de Sergei Soares e Rafael Osório está no livro "Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente", que será lançado amanhã pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Os pesquisadores destacam que, nos últimos anos, devido à oscilação do dólar e às privatizações, houve mudanças significativas nos preços relativos - ou seja, alguns produtos subiram bem mais que outros. Entre 1995 e setembro de 2005 (data de referência da última pesquisa nacional de renda), o preço das comunicações, por exemplo, subiu 770%. Já a inflação de alimentos e do vestuário, itens com grande peso no orçamento dos mais pobres, foi de apenas 77% e 53%, respectivamente.

Mas as estatísticas que medem a renda corrigem o valor dos salários e de outros rendimentos pela inflação média, não levando em conta as diferentes cestas de compras de ricos e pobres. Por isso, Sergei Soares e Rafael Osório criaram índices de inflação específicos para cada camada da população. A partir daí, mediram a queda na desigualdade do poder de compra.

No artigo, eles lembram que as famílias abastadas gastam mais com transporte, educação e comunicações, serviços que subiram bem mais que a média da inflação. Para os mais pobres, os preços de alimentos, beneficiados pela queda do dólar, têm peso maior. Os pesquisadores lembram que a inflação, na última década, teve um viés "pró-pobre". Mesmo nos anos em que houve desvalorização do câmbio, como 1999 e 2002, a alta nos preços da cesta de compras dos pobres não foi suficiente para compensar os aumentos menores de outros períodos. "A apreciação do real que desespera os exportadores traz diversidade para a mesa das camadas menos favorecidas da população", diz o texto.

DESIGUALDADE CAI NO RITMO DO AUMENTO DA DISPARIDADE DOS ANOS 60, na página 30