Título: Desigualdade cai em ritmo igual ao do aumento da disparidade dos anos 60
Autor: Rodrigues, Luciana
Fonte: O Globo, 12/04/2007, Economia, p. 30

Número de brasileiros que ganham menos de R$100 caiu 7,3 milhões.

A melhora recente na distribuição de renda dos brasileiros teve magnitude semelhante à da piora desse indicador verificada na década de 60. Em livro a ser lançado amanhã, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) reuniu artigos de especialistas de diferentes tendências para avaliar a queda na desigualdade, mazela secular do Brasil. Os analistas são unânimes em reconhecer que houve redução contínua e significativa na disparidade de renda dos brasileiros entre 2001 e 2005.

E, para dar idéia da dimensão dessa melhora, o professor da Unicamp Rodolfo Hoffmann comparou os indicadores recentes com os dos anos 60. Naquela época, o Índice de Gini (que mede a desigualdade de renda e quanto maior, pior) subiu oito pontos percentuais em apenas dez anos, motivando críticas de especialistas e um intenso debate político. Foi uma alta equivalente a 0,8 ponto percentual por ano. Entre 2001 e 2005, o Índice de Gini recuou 2,8 pontos percentuais - um recuo de 0,7 ponto por ano.

Brasil ainda é o oitavo mais desigual do mundo

Hoffmann também calculou quantas pessoas deixaram a camada mais pobre da população, com rendimento domiciliar per capita é inferior a R$100. Entre 2001 e 2005, a parcela da população nessa faixa de renda caiu de 23% para 17,4% - 7,34 milhões de brasileiros deixaram essa linha de pobreza.

No livro "Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente", organizado pelo Ipea, os pesquisadores apontam diferentes motivos para a redução da pobreza e a queda na disparidade de renda desde 2001: melhora na educação, programas sociais com maior foco (principalmente o Bolsa Família), mais dinamismo econômico do interior do país e, para alguns, os ganhos reais do salário mínimo.

Mas eles alertam que, apesar da recente melhora, a situação brasileira ainda é vergonhosa: o país ostenta a oitava posição no ranking dos mais desiguais do mundo, entre 124 nações para as quais há dados disponíveis.

Ainda assim, a melhora da distribuição de renda a partir de 2001 foi significativa para padrões históricos - o Índice de Gini recuou ao menor patamar em três décadas - e por parâmetros internacionais. No artigo "A queda recente da desigualdade de renda no Brasil", os pesquisadores Ricardo Paes de Barros, Mirela de Carvalho, Samuel Franco e Rosane Mendonça argumentam que menos de 25% dos 74 países para os quais há informações conseguiram melhorar a distribuição de renda a um ritmo superior ao do Brasil entre 2001 e 2005.

O economista Marcelo Neri, chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e autor de três artigos do livro, argumenta que, se os anos 90 foram marcados pela conquista da estabilidade na economia, a década atual tem como característica a redução na desigualdade de renda.

- Mas a estabilidade continua gerando dividendos. Apesar de não ser mais a protagonista da economia, a estabilidade tem um papel importante na redução da pobreza e na melhora da distribuição de renda, porque propiciou maior oferta de crédito e aumento na geração de empregos - afirma.

Efeito do salário mínimo divide especialistas

Na avaliação de Neri, a melhora do mercado de trabalho ocorreu apesar dos aumentos recentes do salário mínimo. Para o economista, o piso salarial, que ajudou a reduzir a desigualdade de renda na década de 90, perdeu essa função nos anos recentes. Neri lembra que, desde 1994, o salário mínimo dobrou de valor, em termos reais. Por conta disso, o piso teria ficado caro demais, levando a demissões e maior informalidade no mercado de trabalho.

- Acredito que o salário mínimo, agora, possa estar mais atrapalhando do que ajudando - diz Neri.

No livro organizado pelo Ipea, entretanto, outro especialista, Claudio Dedecca, da Unicamp, defende que o salário mínimo teve contribuição significativa para a queda recente na desigualdade. Ele argumenta que houve ganhos de renda significativos justamente entre os trabalhadores que recebem valores próximos ao do piso salarial. E que parte significativa das vagas criadas nos últimos anos foi criada em postos de trabalho que pagam perto do mínimo.