Título: FAB e Defesa divergem em público sobre panes aéreas
Autor: Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 12/04/2007, Economia, p. 32

Para Anac, problemas não configuram crise. Waldir Pires diz que caos nos aeroportos se deveu a erros de gestão e a equipamentos obsoletos defeituosos.

BRASÍLIA e RIO. As autoridades responsáveis pela aviação civil demonstraram ontem, mais uma vez, a desarticulação do gerenciamento do setor, ao divergirem nas quase oito horas de audiência pública na Câmara sobre o apagão aéreo. O presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Milton Zuannazzi, disse que a crise não chega a ser uma crise, enquanto o ministro da Defesa, Waldir Pires, não só a reconheceu várias vezes ao longo de sua exposição, como atribuiu-a à falta de gestão e a problemas com equipamentos. Ao seu lado, o comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, evitou ao máximo a palavra e retrucou que os radares são supermodernos, e que para resolver a situação basta formar mais profissionais.

Cobrados pela oposição sobre, afinal, qual seriam o plano e o prazo - como já fez o presidente Luiz Inácio Lula da Silva - para solucionar o apagão aéreo, as autoridades não ofereceram resposta concreta aos parlamentares. Defenderam apenas ações genéricas.

Baixa seria "tiro no pé", diz comandante da Aeronáutica

Pires voltou a defender a desmilitarização, "com todo o respeito à Aeronáutica", e insinuou que o controle de tráfego aéreo militar tornou-se uma caixa-preta. Já Saito disse não ser nem contra nem a favor, dando a entender que a FAB não trabalha com essa proposta, pelo menos por enquanto. Disse ainda que há entraves para a transferência do serviço à esfera civil e que cumpre apenas seu dever constitucional:

- O nosso é um controle integrado. Não é uma coisa simples separá-lo. É um sistema quase único - disse ele.

Durante a audiência, Saito admitiu que uma baixa coletiva - cogitada pelos controladores militares para forçar o governo a reabrir um canal de negociação - vai causar transtornos ao controle de tráfego. E aproveitou para alertar os profissionais, alegando que eles têm família e um ato desses seria um "tiro no pé":

- Eles têm juízo. Claro que haveria uma degradação, mas temos planos.

- Nós temos uma crise decorrente de fatores definidos em procedimentos de gestão - disse o ministro Waldir Pires. - Há problemas de recursos humanos. Há problemas de equipamentos.

- Dizem que o sistema é obsoleto. Mas os radares (Brasília e Manaus) são supermodernos. Voar no Brasil é absolutamente seguro. As comunicações são absolutamente confiáveis - rebateu Saito.

Ele disse que é uma "maldade apontar a existência de buraco negro no sistema":

- Temos equipamentos, mas há uma absoluta falta de controladores.

Para Saito, com o acidente com o avião da Gol, em setembro, mais de 30 profissionais tiveram de ser afastados do controle, o que reduziu o monitoramento do tráfego aéreo. O fato de o sistema ser militar "não tem nada a ver com o problema", embora seja reivindicação antiga do sindicato dos controladores civis, encampada pelos militares. Mas Pires insinuou que o que o acidente fez foi abrir uma caixa-preta, que excede a falta de profissionais, trazendo à luz "vários problemas".

Em outra frente, a da forma de encaminhar a solução para os atuais problemas do setor, Pires fez apologia à negociação.

- É através da política que nós resolvemos os impasses da nossa sociedade. Quando tentamos resolver fora da política, foi um retrocesso - afirmou o ministro, enquanto o setor de comunicação da FAB dizia, na platéia da audiência, que a Força "não negocia".

Pires defendeu ainda a condução de Lula na crise. Disse que o presidente, como chefe supremo das Forças Armadas, tem legitimidade para agir em determinadas circunstâncias para restabelecer o clima de paz, mesmo que contrarie normas específicas.

- Naquele momento, o presidente não tinha alternativa - explicou o ministro, ao se referir ao acordo com os amotinados.

Já Zuanazzi destacou que o brasileiro viveu apenas 14 dias de transtornos nos aeroportos entre as operações-padrão de outubro e o motim de 30 de março. Ele alegou que os problemas já foram identificados, mas são de difícil solução, e preferiu reverenciar o bom momento da aviação do ponto de vista dos negócios.

- A crise está longe de ser uma crise. Estamos vivendo o melhor momento do ponto de vista da oferta de assentos da história da aviação brasileira - disse Zuanazzi, ponderando que a Anac está avaliando 382 reclamações de atrasos e cancelamentos que podem resultar em punição para as empresas.

Ele enfatizou que o setor não está preocupado com crise ou paralisações, mas apostando no crescimento da demanda. Entre 2006 e 2007, disse, as companhias investiram R$3,4 bilhões. Porém, o representante da Associação Brasileira das Agências de Viagens (Abav), João Quirino Júnior, presente no encontro, disse que o setor teve uma queda no faturamento de 40%, desde o acidente com o avião da Gol. Na contramão, a representante da Embratur, Jeanine Pires, disse que o turismo cresceu no período, com aumento dos embarques e desembarques.

A sessão de ontem teve de ser encerrada por ordem da presidência da Câmara. Para Onix Lorenzoni (DEM-RS), as divergências reforçaram a incompetência do governo para gerenciar a crise, o que reforça a instalação da CPI.

O presidente da Associação dos Controladores de Vôo do Rio, Jorge Nunes de Oliveira, disse que não acredita em um movimento de pedido de baixa coletivo por parte dos controladores militares, mas admite que os profissionais estão, de fato, pensando nisso. Segundo ele, a falta de definição e o recuo do governo na negociação com os controladores mexeram com os ânimos.

COLABOROU Erica Ribeiro