Título: Limites para greve de servidores
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 13/04/2007, O País, p. 3

Maioria dos ministros do STF defende aplicação da lei que vale para setor privado e critica Congresso.

Sete dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram ontem a favor da aplicação da mesma lei que regulamenta a greve de trabalhadores do setor privado nos casos de paralisações de servidores públicos. Embora o direito de greve no serviço público tenha sido incluído na Constituição de 1988, o Congresso Nacional nunca chegou a um consenso para aprovar uma lei que discipline e regulamente as paralisações. Ontem, os integrantes da mais alta corte do Judiciário criticaram a omissão dos parlamentares e disseram que a falta de regulamentação tem prejudicado os servidores da União, dos estados e de municípios.

A discussão foi suspensa e o julgamento não foi concluído por causa de um pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa. Entretanto, caso nenhum dos ministros mude de posição quando o debate for retomado, em data ainda indeterminada, a maioria dos magistrados já se manifestou sobre o tema, e os servidores terão direito à greve, mas com os mesmos limites impostos a trabalhadores da iniciativa privada.

Serviços essenciais, paralisação parcial

O Supremo Tribunal Federal discutiu o assunto ao julgar ações de sindicatos de servidores públicos do Pará e do Espírito Santo. As entidades questionavam a falta de regulamentação para o direito de greve da categoria. O julgamento das ações já tinha começado em junho do ano passado, quando o relator do processo, ministro Eros Grau, defendeu a aplicação da mesma legislação que regula as greves no setor privado para as manifestações dos servidores públicos - até que o Congresso Nacional aprove uma lei específica para a categoria. Na ocasião, Gilmar Mendes concordou com a tese, mas o julgamento não chegou ao fim.

Os outros integrantes da Corte que votaram na sessão de ontem concordaram com o relator. Todos os oito ministros que se manifestaram sobre o tema defenderam que, assim como os trabalhadores do setor privado, os funcionários públicos são obrigados a exercer o direito de greve de forma limitada. Por exemplo, serviços essenciais à sociedade não podem ser totalmente interrompidos. Nesse aspecto, vários ministros citaram o exemplo dos controladores de vôo, que recentemente paralisaram o trabalho de forma integral - o que, quando o STF concluir a votação, será absolutamente proibido.

A discussão sobre os limites impostos às greves dos servidores públicos não foi concluída. Isso deverá acontecer quando o ministro Joaquim Barbosa, autor do pedido de vista, devolver o assunto ao plenário - o que também ainda não tem data marcada.

"O que existe é uma lei da selva"

No entanto, o ministro Gilmar Mendes defendeu que os servidores em greve não tenham o direito de receber o salário referente ao período de paralisação. Com a adoção dessas regras, os movimentos sindicais podem sair perdendo. Isso porque atualmente não existe norma alguma para o exercício da greve no setor público.

- O que existe atualmente é uma lei da selva. Greves continuam a ser realizadas sem nenhum controle jurídico por funcionários públicos. A não atuação do tribunal neste caso configuraria uma espécie de omissão judicial - disse Gilmar Mendes.

Ao pedir vista, Joaquim Barbosa ressaltou que o Congresso Nacional programou para as próximas semanas audiências públicas para discutir justamente a regulamentação do direito de greve dos servidores públicos. Ele questionou se, disciplinando sobre o assunto, o Judiciário não estaria se antecipando a uma decisão que deveria ser tomada exclusivamente pelos parlamentares.

Já a ministra Carmen Lúcia Antunes Rocha e o ministro Celso de Mello criticaram o Congresso pela falta de uma regulamentação para o assunto:

- Se há o abuso do poder de legislar, esse é um caso de abuso do poder de não legislar - disse a ministra.

- Não mais se pode tolerar esse estado de continuada, inaceitável e abusiva inércia do Congresso Nacional - concordou Celso de Mello.

O ministro Ricardo Lewandowski, porém, levou ao plenário um voto contrário ao de seus colegas. Ele argumentou que os serviços prestados por trabalhadores de empresas privadas e de órgãos públicos têm características diferentes e, portanto, não poderiam ser equiparados em apenas uma legislação. Além disso, Lewandowski alegou que, ao disciplinar esse assunto, o STF poderia estar se intrometendo em uma atividade exclusiva do Legislativo.

- Não vejo relevante semelhança entre a greve dos trabalhadores do setor privado e dos servidores públicos. As implicações e conseqüências de uma greve de empregados do setor privado e do público para a sociedade são diferenciados. Por exemplo, uma greve de professores do ensino privado não pode ser tratada da mesma forma que uma greve de controladores de vôo - ponderou ele.