Título: Ganho de R$10 para pobre e de mil reais para rico reduziria desigualdade
Autor: Rodrigues, Luciana
Fonte: O Globo, 14/04/2007, Economia, p. 32

Conta ilustra tamanho da disparidade. Ipea, porém, vê melhora até em 2006.

A desigualdade de renda no Brasil é tanta que se, num único ano, os brasileiros mais pobres ganhassem R$10 adicionais e os mais ricos, mil reais, ainda assim a disparidade entre ambos diminuiria. Proporcionalmente, os R$10 significariam muito mais para os pobres do que os mil reais para os ricos. A conta foi apresentada ontem por Ricardo Paes e Barros, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), para ilustrar o tamanho da injustiça social.

Paes e Barros, um dos maiores estudiosos sobre o assunto no país, lançou ontem no Rio o livro "Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente", que reúne artigos de especialistas do Ipea e de outras instituições. No livro, Rodolfo Hoffmann, da Unicamp, dá outra medida da exclusão no Brasil. Ele calculou o nível de renda a partir do qual um brasileiro torna-se relativamente rico. E chegou a R$512 (rendimento domiciliar per capita). Qualquer acréscimo de renda para quem recebe mais do que isso elevaria a desigualdade no Brasil, pelo Índice de Gini, se não houvesse ganho para os demais brasileiros. Só 15% da população têm renda superior a R$512.

Os artigos reunidos no livro concordam com o fato de que a queda da desigualdade entre 2001 e 2005 foi a mais intensa das últimas três décadas. Ontem, Paes e Barros foi além. Afirmou que os dados apontam para uma continuidade dessa tendência em 2006, pelo menos no mercado de trabalho. Havia uma suspeita, entre os especialistas, de que a melhora da distribuição de renda perdera fôlego.

- Os resultados mais recentes da Pesquisa Mensal de Emprego (do IBGE) tiram um pouco essa dúvida. Talvez a redução da desigualdade tenha até se acelerado - afirmou Paes e Barros, lembrando, porém, que essa hipótese só poderá ser confirmada quando a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2006 for divulgada, com dados sobre outras fontes de rendimento, como Bolsa Família e aposentadorias.

Mercado de trabalho ficou menos produtivo

O economista reconheceu que, nos últimos anos, a queda da desigualdade veio acompanhada de uma perda de produtividade no mercado de trabalho. Entre 2001 e 2005, a renda do trabalhador caiu, em média, 5,74%. E o que é mais preocupante: considerando profissionais de mesmas características (cor, escolaridade, gênero etc.), 82% tiveram queda de renda e só 18%, ganhos.

Paes e Barros destacou, porém, que esses 18% que viram sua renda aumentar são justamente os mais pobres, menos escolarizados e que vivem nas cidades menores. Ou seja, a perda de produtividade teve um viés de redistribuição de renda.

No debate que se seguiu à apresentação de Paes e Barros, Ricardo Bielschowsky, do escritório da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal) no Brasil, lembrou que é preciso ter mais crescimento econômico para acelerar a melhora na distribuição de renda:

- Sem crescimento, ficamos quase que enxugando gelo com transferências (de renda), sem construir uma sociedade mais justa a longo prazo.