Título: Resultado do carnaval deste ano sob suspeita
Autor: Engelbrecht, Daniel e Antunes, Elizabete
Fonte: O Globo, 16/04/2007, Rio, p. 12

Escutas telefônicas de conversas de presos pela PF mostram indícios de manipulação no julgamento dos desfiles.

Em entrevista ao programa "Fantástico", da Rede Globo, o delegado federal Emanuel Henrique Oliveira, que participou da Operação Hurricane (furacão, em inglês), deflagrada na sexta-feira contra a cúpula da contravenção no Rio, disse haver indícios de que o resultado do carnaval deste ano, vencido pela Beija-Flor de Nilópolis, tenha sido manipulado. A suspeita surgiu a partir de escutas telefônicas de conversas de alguns dos presos na operação, entre eles Aniz Abraão David, o Anísio, presidente de honra da Beija-Flor, e Aílton Guimarães Jorge, o Capitão Guimarães, presidente da Liga das Escolas de Samba do Rio. A reportagem também mostrou o momento em que policiais federais encontraram R$10 milhões numa câmara secreta na casa de Júlio Guimarães Sobreira, sobrinho do Capitão Guimarães.

- Esse grupo, mais do que uma organização criminosa, é um grupo mafioso que tem audácia, que demonstra poder, que faz questão de demonstrar o poder, interferindo no Legislativo, no Judiciário, no Executivo e até no resultado do carnaval do Rio. Há indícios de que esse resultado foi manipulado pelo senhor Anísio - disse o delegado, sem entrar em detalhes.

Presidente da Beija-Flor desconhece manipulação

Fontes da cúpula da PF, que está recebendo informes o tempo todo dos delegados envolvidos no caso, revelaram que, nas conversas entre os acusados, fica claro que o resultado do carnaval de 2007 foi fraudado.

O prefeito de Nilópolis e presidente da Beija-Flor, Farid Abraão David, disse que desconhece qualquer manipulação e desafiou a polícia a apresentar provas.

- Sinceramente, desconheço isso. Cabe ao delegado provar. Ele tem as gravações, então que prove. O carnaval do Rio hoje é um exemplo de organização, acho difícil que tenha alguma manipulação. Esse carnaval foi o melhor dos últimos anos - afirmou.

As primeiras imagens exibidas pela reportagem mostram os agentes na casa de Júlio, em Petrópolis, na Região Serrana do Rio. No local, são encontrados R$600 mil num cofre. De lá, os policiais seguem para um escritório do sobrinho do Capitão Guimarães, na Zona Norte do Rio. Num dos cômodos do imóvel, os agentes federais desconfiam de que possa haver documentos ou dinheiro escondidos dentro de um armário embutido e resolvem arrancar a madeira do fundo do móvel. Por trás, surge uma parede de alvenaria.

Nesse momento, as imagens mostram federais se aproximando com uma marreta. Um deles diz: "Vamos quebrar tudo". Entusiasmados, os agentes abrem a marretadas um buraco na parede e, com uma lanterna, observam a câmara secreta que se descortina. Um policial, então, grita, eufórico:

- Muita grana, moleque!

Pelo buraco, podem ser vistos diversos malotes no chão. Num deles os policiais encontram dezenas de pacotes de R$10 mil. Os malotes foram transportados de helicóptero e num carro-forte para o Banco Central, onde ficaram guardados. Antes, o dinheiro foi contado com ajuda de máquinas na Superintendência da Polícia Federal, na Praça Mauá. O total apurado foi de R$10 milhões, além de 300 mil euros (cerca de R$800 mil), jóias e 60 relógios avaliados em R$40 mil cada um.

O delegado aposta que a Operação Hurricane será um divisor de águas no combate à corrupção no Rio.

- Isso vai ter um impacto muito importante. Acho que teremos a perspectiva de ter um novo Rio de janeiro. Isso vai influenciar nas policias Civil e Militar e vai ter influência na Policia Federal. Eu acho que é um marco que vai traçar um divisor de águas. Antes da Operação Hurricane e agora, com a Operação Hurricane.

A imprensa internacional também deu destaque à operação. Com o título "Brazil police crack down on gambling", ("Polícia brasileira reprime jogo"), o "Washington Post", dos Estados Unidos, usou fotos de Anísio no carnaval carioca para ilustrar a reportagem. O site da emissora americana CNN também tratou do assunto.

O "La República", do Peru, publicou reportagem com o título "Golpe a la "mafia del carnaval"" ("Golpe na máfia do carnaval" no Rio de Janeiro). O "El País", da Espanha, lembrou que parte dos acusados ocupa cargos no Poder Judiciário.