Título: Esquema confirmado
Autor: Carvalho, Jaílton de e Gripp, Alan
Fonte: O Globo, 17/04/2007, Rio, p. 9

A MÁFIA OFICIAL

Juiz preso revela em depoimento que havia venda de decisões judiciais para máfia de caça-níqueis.

Em depoimento à Polícia Federal no fim de semana, o juiz Ernesto da Luz Pinto Dória, do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Campinas (SP), confirmou, segundo um investigador do caso, o esquema de venda de decisões judiciais e informações privilegiadas para a máfia dos bingos e dos caça-níqueis. Dória foi um dos 25 presos pela PF semana passada, na Operação Hurricane, acusados de fazer parte dessa rede de corrupção.

Além do juiz, foram presos o advogado Virgílio de Oliveira Medina, irmão do ministro Paulo Medina, do Superior Tribunal de Justiça (STJ); o procurador regional da República João Sérgio Leal Pereira; e os desembargadores José Eduardo Carreira Alvim (ex-vice presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região) e José Ricardo de Siqueira Regueira. Os bicheiros Aniz Abrahão David, o Anísio; Ailton Guimarães Jorge, o Capitão Guimarães; e Antônio Petrus Kalil, o Turcão, também foram presos pela PF.

Para os investigadores, o depoimento de Dória foi o mais importante até agora, por ter confirmado a venda de liminares. A maioria dos acusados preferiu ficar calada. Numa das conversas gravadas pela PF com autorização judicial, os advogados Virgílio Medina e Sérgio Luzio Marques negociam uma liminar por R$1 milhão. O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, que defende Paulo Medina, confirmou a existência do diálogo, mas negou qualquer envolvimento do ministro com o caso:

- É claro que essa gravação existe, senão o caso não estaria no STF. Mas ele (Paulo Medina) está com a consciência tranqüila.

Polícia Federal pede prorrogação de prisões

Em 15 de agosto do ano passado, Medina endossou uma decisão do desembargador Carreira Alvim determinando a liberação de 900 máquinas caça-níqueis para a Betec Games Comércio Participações e Empreendimentos Ltda. As máquinas tinham sido apreendidas pela PF por ordem da 4ª Vara Federal de Niterói.

- Se alguém usou indevidamente o nome dele, é um crime grave, que deve ser apurado. Mas ele se nega a acreditar na hipótese do envolvimento do irmão dele - disse o advogado.

No fim da tarde de ontem, a PF decidiu pedir a prorrogação por mais cinco dias da prisão temporária dos 25 acusados presos na chamada Operação Hurricane. O prazo do primeiro pedido vence às 6h de amanhã. Se até lá não houver decisão, os acusados devem ser soltos. O pedido da PF foi encaminhado ao ministro Cezar Peluso, do STF.

A PF ouviu até ontem 20 dos 25 presos sexta-feira na Operação Hurricane. Nesta segunda-feira, prestaram depoimento três delegados federais suspeitos de envolvimento com a máfia dos caça-níqueis. Com os três, a PF apreendeu mais de R$160 mil, que os agentes investigam se são recursos de pagamento de propina. Eles negaram as acusações.

Apenas com o delegado Carlos Pereira da Silva, da Polícia Federal de Niterói, foram apreendidos cerca de US$60 mil e R$18 mil. Em seu depoimento, que durou duas horas e meia, ele disse que os dólares são fruto da venda de um apartamento de sua mãe em Copacabana e que os reais foram sacados por ele próprio para o pagamento de operários que trabalham na reforma de sua casa.

Também foram ouvidos a delegada Susie Pinheiro Dias de Matos, que está cedida à Agência Nacional do Petróleo (ANP), onde ocupa o cargo de corregedora, e seu marido, o delegado aposentado Luiz Paulo Dias de Matos. Com os dois, a PF encontrou US$12 mil. Segundo o advogado do casal, Paulo Lins, o dinheiro é uma sobra de dólares levados por eles em uma recente viagem a Portugal, onde teriam visitado parentes.