Título: Coordenador dos jurados escondia a fortuna
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Fonte: O Globo, 17/04/2007, Rio, p. 10

MÁFIA OFICIAL: Patrono da Beija-Flor nega que tenha havido manipulação do resultado dos desfiles no carnaval.

Os R$9 milhões apreendidos pela PF estavam atrás da parede do escritório de sobrinho do presidente da Liesa.

BRASÍLIA e RIO. Os R$9 milhões mostrados na reportagem exibida domingo no "Fantástico", descobertos pela Polícia Federal dentro de uma câmara secreta, estavam na casa de Júlio Guimarães Sobreira, que coordenou o corpo de jurados no carnaval deste ano. O delegado federal Emanuel Henrique Oliveira, que participou da Operação Hurricane (Furacão), disse que há indícios de que o júri tenha sido manipulado por Aniz Abrão David, o Anísio, patrono da Beija-Flor de Nilópolis, campeã deste ano.

Júlio Guimarães é sobrinho de Aílton Guimarães Jorge, presidente da Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa). Desde que Capitão Guimarães voltou ao cargo, no carnaval de 2002, Julinho faz a coordenação dos julgadores dos desfiles. A escolha dos jurados e sua orientação, porém, são de responsabilidade exclusiva do presidente da Liga.

A responsabilidade pelo corpo de jurados passou para a Liesa no carnaval de 1987, quando o presidente da entidade era Anísio Abrão David - até então, a escolha dos julgadores era de responsabilidade da Riotur. O primeiro coordenador do júri foi Hiram Araújo, pesquisador de carnaval que hoje cuida do Centro de Memória da Liesa. Hiram esboçou o formato de julgamento que, em linhas gerais, é usado até hoje:

- O julgamento é subjetivo, mas tem credibilidade. Ele não pode ser objetivo, mas os jurados são isentos e não há dúvidas de que o resultado é sério - disse Hiram.

Anísio negou ontem, por intermédio de seu advogado, a acusação de que tenha manipulado o resultado do carnaval carioca deste ano, vencido pela escola de Nilópolis. Segundo Ubiratan Guedes, Anísio disse ser tecnicamente impossível "comprar" o resultado, pois os desfiles são avaliados por 40 jurados.

- Quem viu o desfile sabe que não houve fraude - disse o advogado.

Escuta telefônica revela detalhes da suposta fraude

Fontes da PF disseram ao GLOBO que os indícios estão em conversas telefônicas de Anísio interceptadas com autorização judicial. Numa das ligações, o presidente de honra da Beija-Flor menciona detalhes da suposta manipulação com o dirigente de outra escola, cujo nome não foi revelado.

Guedes também negou que seu cliente tenha alguma rixa com o bicheiro Antônio Petrus Kalil, o Turcão. A PF investiga a informação de que Anísio teria "comprado" uma operação de agentes federais de Niterói, que apreendeu máquinas de caça-níqueis, para provocar uma baixa nos negócios do suposto rival.

Anísio prestou depoimento de 22 minutos, no sábado à noite. Guedes contou que o contraventor disse ter declarado à Receita a posse de US$40 mil dos US$47 mil apreendidos com ele. O restante, segundo Guedes, seria declarado este ano. Perguntado sobre os motivos que levavam Anísio a guardar tanto dinheiro em casa, o advogado respondeu, em alusão ao ex-assessor parlamentar petista José Adalberto Vieira, preso no Ceará com dinheiro na cueca:

- Isso é muito subjetivo. Tem gente que guarda dinheiro até na cueca.