Título: Brasil, Venezuela e Bolívia divergem em cúpula
Autor: Galhardo, Ricardo
Fonte: O Globo, 18/04/2007, Economia, p. 27

Impasse sobre etanol atrasa declaração. Lula é ríspido com Morales e nega adesão a "Opep do gás" e Banco do Sul

PORLAMAR, Venezuela, e LA PAZ. O último dia da Cúpula Energética Sul-americana, em Porlamar, na Venezuela, foi marcado por divergências. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve uma conversa dura com o presidente da Bolívia, Evo Morales, sobre o temor de invasão militar aos campos operados pela Petrobras. Lula também não escondeu a irritação ao desmentir o ministro da Energia da Bolívia, Carlos Villegas, sobre a adesão do Brasil à "Opep do gás", um projeto de Morales, Hugo Chávez (Venezuela) e Néstor Kirchner (Argentina). Segundo Lula, a questão não foi discutida. Lula disse que ainda não há decisão sobre aderir ao Banco do Sul, outro projeto de Chávez e Kirchner. A adesão chegou a ser anunciada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, no fim de semana. Além disso, dissonâncias sobre o etanol atrasaram a divulgação do documento final da cúpula.

- Como somos presidentes livres e democráticos, cada um fala o que quiser nos corredores - disse Lula, referindo-se ao ministro boliviano.

Horas antes, Villegas havia dito à TV estatal da Venezuela que o Brasil pedira para aderir à "Opep do gás". Segundo ele, o pedido fora feito na noite anterior pelo ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau. Antes mesmo da declaração de Lula, Rondeau disse a interlocutores ser contrário à adesão brasileira, devido à segregação entre produtores e consumidores de gás. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, também descartou a adesão.

Com relação ao Banco do sul, Lula disse que ainda não há uma decisão:

- Primeiro, é preciso definir para quê queremos um banco, qual a sua finalidade, para depois, então, sabermos se compensa participar ou não.

A "Declaração de Margarida" só foi divulgada no início da noite, devido ao impasse. O documento faz referência ao risco de desabastecimento alimentar mas não vincula o problema ao etanol. Segundo o texto, é importante garantir que nenhuma matriz energética prejudique a produção de alimentos.

Chávez agora quer negócios de etanol com Brasil e EUA

Por pressão brasileira, foram incluídas a "importância do desenvolvimento das energias renováveis" e o reconhecimento ao potencial dos biocombustíveis. Venezuela e Bolívia defendiam uma crítica ao etanol. A divergência só foi superada após um reunião entre Lula e Chávez - este acabou pedindo que o Brasil intermedie a exportação de etanol venezuelano para os EUA.

- Parece piada, mas não é - ironizou Chávez, que se esforçou para diluir a imagem de atrito com o Brasil.

Chávez confirmou que a Venezuela voltará a importar etanol brasileiro. A estimativa são 200 mil barris diários.

Antes de se encontrar com Chávez, Lula teve uma reunião com Morales. Segundo relatos de diplomatas, a conversa foi dura, e Lula chegou a ser ríspido. O motivo seria o temor de uma nova invasão por parte das Forças Armadas bolivianas aos campos de petróleo operados pela Petrobras.

As principais decisões da cúpula foram a criação do Conselho Energético Sul-americano, a mudança do nome da Comunidade Sul-americana de Nações para União Sul-americana de Nações (Unasul) e a criação de uma Secretaria Permanente da América do Sul para a discussão dos problemas energéticos.

(*) Com agências internacionais