Título: Um desenvolvimentista no BNDES
Autor: Oliveira, Eliane e Melo, Liana
Fonte: O Globo, 19/04/2007, Economia, p. 21

Para o banco ter "a cara" do PAC, Lula escolhe Luciano Coutinho, crítico do BC.

Após mais de um mês de disputas nos bastidores, prevaleceu a vontade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: o economista Luciano Coutinho, crítico do Banco Central (BC) e considerado um dos maiores expoentes dos desenvolvimentistas no Brasil, será o novo presidente do BNDES. Com um orçamento superior a R$60 bilhões, a instituição é o maior banco de fomento do mundo. Lula bateu o martelo ontem à tarde, em reunião com Coutinho e o novo ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge.

A escolha de Coutinho põe fim a uma disputa entre os ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento e traz, pelo menos, duas importantes sinalizações. Em primeiro lugar, a instituição está sob o crivo do Palácio do Planalto, que considera o BNDES o principal instrumento da política industrial do governo. Em segundo lugar, Lula quer alguém com perfil desenvolvimentista, para que a instituição volte a ser o banco das grandes obras, aproveitando o quadro de expansão dos investimentos no país.

Com trânsito no PT - ajudou nas campanhas de Lula desde o primeiro mandato - e consultor informal do governo em projetos como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Coutinho sempre foi alguém que Lula gostaria de ver em sua equipe. Ele chegou a ser escalado, em 2003, para mediar a fusão da Varig com a TAM, que não foi adiante. Também foi um dos cotados, no primeiro mandato, para o Planejamento e a Previdência.

Coutinho deve "esquentar" debate no governo sobre juros altos

Embora não seja filiado a partidos - teve forte ligação com o então MDB de Ulysses Guimarães e depois se aproximou do PSB -, Coutinho tem um viés à esquerda que agrada a Lula. Argumenta que o país vem perdendo oportunidades de investimentos devido aos juros altos. Lula conhece bem o pensamento de Coutinho. Sabe que ele brigará por mais acesso do setor produtivo ao crédito e pela queda dos spreads (diferença entre a taxa que o banco paga e a que cobra) e da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), hoje em 6,5% ao ano. Para fontes do governo, o debate econômico fica, no mínimo, "mais animado", com Coutinho forte, afinado com os discursos de Guido Mantega (Fazenda) e Dilma Rousseff (Casa Civil).

Com a decisão, oficializada no início da noite pelo porta-voz da Presidência, Marcelo Baumbach, Mantega - que já presidiu o BNDES - perde influência sobre o banco. Ele tentou manter Demian Fiocca no cargo, e agora deve convidá-lo para sua equipe, como secretário do Tesouro. Mas, segundo fonte ligada a Fiocca, dificilmente o convite será aceito.

Já o ministro do Desenvolvimento perdeu a chance de emplacar Gustavo Murgel, com quem trabalhou no Santander, pois ele é da área financeira. Lula queria um desenvolvimentista, com conhecimento sobre o setor produtivo e desenvoltura no meio. A opção por Coutinho tem a ver com a vontade do presidente e de líderes do setor privado de haver alguém "com a cara" do PAC no BNDES.

A repercussão foi a melhor possível entre empresários. Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro, Coutinho tem bagagem acadêmica e conhece a realidade econômica do país:

- Foi uma escolha extremamente feliz. Coutinho estará à frente do BNDES em um momento em que a economia brasileira se prepara para viver um círculo expansivo, com a melhoria das condições macroeconômicas.

O presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) e o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, mostraram-se otimistas, mas não pouparam elogios a Fiocca. O presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), Eduardo Gouvêa Vieira, disse que Coutinho é um nome ideal para presidir o BNDES, por conhecer bem a estrutura do banco.