Título: Dividido, BC reduz juro básico em só 0,25 ponto
Autor: Batista, Henrique Gomes e Eloy, Patricia
Fonte: O Globo, 19/04/2007, Economia, p. 24

Três diretores votam por corte de 0,5 na Selic, que recuou para 12,5%, e analistas já prevêem quedas maiores.

BRASÍLIA, RIO e SÃO PAULO. O Banco Central (BC) deu ontem sinais de que pode voltar a ser mais ousado no corte dos juros nos próximos encontros do Comitê de Política Monetária (Copom). Apesar de reduzir em apenas 0,25 ponto percentual a taxa básica Selic - para 12,5% ao ano, confirmando a expectativa da maior parte dos analistas - três dos sete diretores votaram por uma redução de 0,5 ponto. Na avaliação do mercado, além da melhora dos indicadores de risco-país e inflação nos últimos 45 dias, a proximidade do fim da era da parcimônia nos cortes é acentuada por dois fatores: esta foi a primeira reunião sem Afonso Bevilaqua e a última com Rodrigo Azevedo, ambos considerados os mais conservadores do colegiado.

Agora, apenas Mário Mesquita - sucessor de Bevilaqua e muito afinado com ele - seria um defensor mais intransigente da ortodoxia dentro do banco. O diretor que substituirá Rodrigo Azevedo, Mario Torós, tem perfil de operador, mais técnico. E, segundo analistas, quando atuava no mercado, comandando a Tesouraria do Santander, era um dos dealers (negociadores) que mais apostavam na queda da Selic. No jargão financeiro, era um "baixista".

Economistas avaliaram que o BC está construindo a transição para retomar os cortes mais intensos da Selic:

- Se o BC cortasse os juros em 0,5 ponto percentual, seria visto como um sinal estranho. Ele teria admitido que errou ao reduzir o ritmo dos cortes em janeiro - avaliou Joaquim Elói Cirne de Toledo, economista da USP e da Nossa Caixa.

Já para o economista Antônio Corrêa de Lacerda, da PUC-SP, se o corte fosse de 0,5 ponto haveria um efeito psicológico importante, pois, na prática, o efeito não seria tão forte. Marcela Prada, analista da Tendências, acredita que o cenário macroeconômico indica que há espaço para cortes.

- O BC continuou cauteloso, mas há espaço e disposição para futuros cortes.

Essa também é a avaliação do economista Carlos Thadeu de Freitas Filho, do Grupo de Conjuntura da UFRJ. Para ele, a inflação sob controle e o dólar fraco abrem espaço para que, na próxima reunião, o Copom reduza os juros em 0,5 ponto percentual, levando a Selic para 12% ao ano:

- A divisão entre os membros do Copom rompeu a postura piloto-automático e mostra que essa idéia começa a ganhar espaço. Na UFRJ, prevemos a inflação a 3,3% este ano, bem abaixo da meta de 4,5%. Com a inflação em níveis tão baixos e um dólar próximo de R$2, o BC pode ser mais flexível.

Já Tatiana Pinheiro, economista-sênior do banco ABN Amro Real, acredita que a atividade econômica aquecida gera incerteza sobre os futuros passos dos membros do Copom:

- Há dúvidas se a atividade, que tem superado as estimativas, poderia gerar uma aceleração da inflação futura, embora não coloque em risco o cumprimento da meta. Bancos centrais são conservadores e, por isso, não acredito que o racha sugira um Copom menos cauteloso nos próximos meses.

A previsão dos analistas do mercado é que a Selic termine o ano em 11,25%. A estimativa foi reduzida em 0,25 ponto percentual há uma semana, segundo a pesquisa semanal que o BC faz com os bancos.

O comunicado do Copom foi sucinto. Apenas informou que foi uma decisão tomada sem viés (ou seja, sem possibilidade de mudança antes de uma nova reunião). Somente na semana que vem as razões serão conhecidas, com a divulgação da ata da reunião.

Indústria: Copom desperdiçou oportunidade

Desde setembro de 2005, o Copom vem reduzindo a Selic. Em julho do ano passado, os juros chegaram ao menor nível da história do Copom. Desde então, a cada 45 dias, os recordes vêm sendo quebrados.

Na avaliação das principais entidades empresariais do país, o Copom desperdiçou mais uma oportunidade para acelerar o ritmo de corte.

- Não há dúvida de que, mais um vez, foi desperdiçada importante oportunidade de um corajoso ajuste na queda dos juros no Brasil - disse o presidente da Fiesp, Paulo Skaf.

Já o diretor do Departamento de Economia do Ciesp, Boris Tabacof, disse que o BC usa "expectativas irreais a respeito da inflação" como justificativa para o corte de 0,25 ponto da Selic. Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a decisão reflete uma "visão incorreta" sobre os fundamentos da economia e "frustra a indústria e todos aqueles que entendem que o Brasil avançou muito em termos de estabilidade econômica nos últimos anos". E, segundo a Força Sindical, "é preciso mais ousadia para injetarmos ânimo na economia".