Título: Supremo julga início da vida
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 20/04/2007, Ciência, p. 30

Audiência pública inédita discute hoje uso de embrião humano em medicina.

OSupremo Tribunal Federal (STF) virou alvo do lobby de religiosos e cientistas. Nas últimas semanas, os ministros da mais alta corte da Justiça receberam pareceres com argumentos contra e a favor ao artigo da Lei de Biossegurança que libera o uso de embriões humanos em pesquisas com células-tronco. O artigo foi contestado por uma ação do Ministério Público Federal, reacendendo a polêmica sobre quando a vida começa. Boa parte da discussão vai acontecer hoje numa audiência pública, a primeira da história do STF.

A sessão servirá para auxiliar os 11 ministros do STF a elaborarem seus votos. O julgamento não foi marcado, mas o relator, o ministro Carlos Ayres Britto, quer levar a ação ao plenário em maio. Para o autor da ação, o ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles, a vida começa após a fecundação. Para ele, usar embriões é um atentado a dois princípios constitucionais: o direito à vida e o direito à dignidade do ser humano.

Fonteles, que é católico, tem ao seu lado outros religiosos. O lobby mais forte tem sido realizado pela Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB). A entidade é representada na causa por dois dos mais renomados juristas do país: Ives Gandra Martins ¿ numerário da Opus Dei, um grupo radical da Igreja Católica ¿ e Francisco Rezek, ministro aposentado do STF. Ambos escreveram um parecer sobre o assunto.

O grupo dos cientistas é liderado pela ONG Movitae e representado por outro jurista renomado, Luís Roberto Barroso. Ele também escreveu um parecer. Barroso ressalta que a lei só permite o uso de embriões que sejam resultado de tratamentos de fertilização in vitro e inviáveis. Ele também lembra que os genitores precisam dar consentimento. Barroso ainda pondera que as pesquisas têm potencial para levar à cura de paralisia, distrofias musculares, esclerose múltipla, diabetes e mal de Parkinson, por exemplo. ¿Não se pode desconsiderar o sofrimento real e concreto das pessoas portadoras dessas e de outras doenças, que precisam de solidariedade e empenho por parte do Estado, da sociedade e da comunidade científica¿, diz o texto.

O advogado ressalta que os debates religiosos não podem tomar conta de questões médicas num estado laico. A professora de bioética da Universidade de Brasília Débora Diniz, que está entre os 17 especialistas convidados pelo STF, argumenta que o momento do início da vida humana é uma questão paralela, que não precisaria ser discutida no julgamento:

¿ Esse é um falso problema trazido pela ação que não precisa ser respondido. Embriões inviáveis não representam uma vida potencial. Não precisamos falar quando a vida se inicia para autorizar a pesquisa com embriões que não chegarão a ser vida, por serem inviáveis.