Título: Bolívia corta gás para o Brasil
Autor: Tavares, Mõnica
Fonte: O Globo, 21/04/2007, Economia, p. 25

Por causa de conflitos internos, fornecimento a São Paulo e Cuiabá é reduzido em 7%.

ABolívia reduziu ontem em 7% o fornecimento do gás natural enviado para o Brasil, em conseqüência dos estragos feitos em uma estação de bombeamento por manifestantes da província de Gran Chaco, no Sudeste do país, onde Petrobras e demais multinacionais têm negócios. O corte total anunciado pela Bolívia, que inclui também as vendas para a Argentina, é de 20% no volume exportado. Dos 24,6 milhões de metros cúbicos diários de gás natural que chegam a São Paulo e são distribuídos ao próprio estado e à região Sul, o fornecimento caiu para 24 milhões - com um corte de 0,6 milhão para a distribuidora Comgás. A TermoCuiabá, que recebia 1,2 milhão de metros cúbicos diários, teve o volume reduzido a zero. As vendas à Argentina caíram 76%, de 5 milhões para 1,2 milhão de metros cúbicos diários.

A Petrobras não foi afetada porque, segundo o Ministério de Minas e Energia, as regras contratuais exigem que, uma vez atendido o mercado boliviano, a prioridade é a estatal brasileira -, que importa mais de 24 milhões de metros cúbicos do insumo por dia para consumo próprio e, especialmente, para a indústria paulista.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi informado pela manhã do corte. Rompendo um silêncio que durava 48 horas - desde a ríspida conversa com o presidente boliviano, Evo Morales, terça-feira, na Venezuela - os ministros das Relações Exteriores, Celso Amorim, e de Minas e Energia, Silas Rondeau, entraram em contato com as autoridades de primeiro escalão da Bolívia para ficarem a par da situação.

Ambos obtiveram a promessa de que a situação será normalizada o mais brevemente possível e de que os contratos com a Petrobras seriam honrados. Na noite de ontem, o governo boliviano anunciou que as exportações serão normalizadas hoje, ao meio-dia.

Segundo as autoridades bolivianas, o corte iniciado ontem é resultado da destruição da estação de bombeamento da Transredes, subsidiária de Shell e Ashmore, na localidade de Yacuiba. Por isso, a produção do campo San Alberto - o maior do país, operado pela Petrobras - foi reduzida de 10 milhões de metros cúbicos diários de gás para 3,4 milhões, já que o escoamento foi comprometido e há um limite na capacidade de armazenamento dos combustíveis.

- No domingo (amanhã), a capacidade de armazenamento de líquidos (em San Alberto) estará completa, e o campo terá que parar - afirmou o vice-presidente da estatal Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB), Sebastián Daroca.

Yacuiba e Villamontes, que ficam em Gran Chaco, disputam com a província de O"Connor o controle do campo Margarita, de olho nos royalties. Manifestantes ameaçam cortar o fornecimento de gás, enquanto o Exército tenta impedir. Uma pessoa já morreu e 20 ficaram feridas nos conflitos. O vice-presidente da Bolívia, Álvaro García Linera, alertou ontem para um "enorme risco" de tragédia em Yacuiba. Para saquear, disse, moradores invadiram a estação da Transredes com tochas.

- O governo da Bolívia vai debelar o movimento (de invasão). O ministro Carlos Villegas (Hidrocarbonetos) me garantiu que o fornecimento de gás ao Brasil é prioridade - disse Rondeau.

O diretor-presidente da Pantanal Energia, Carlos Baldi, empresa que é dona da TermoCuiabá, disse que a usina recebeu gás boliviano até a madrugada de ontem. Durante o dia, porém, o fornecimento foi suspenso. A termelétrica está com o gasoduto cheio, o que, disse o executivo, garante a operação por uma semana.

Para Baldi, o problema deve persistir nos próximos dias. Mas ele descartou risco de apagão, porque a usina poderá usar óleo diesel para gerar energia. O processo de mudança de combustível não é complexo, segundo ele, e pode ser implantado em um dia. O diesel, porém, é cerca de seis a sete vezes mais caro.

O volume máximo de gás que a usina recebe quando está a pleno vapor é de 2,2 milhões de metros cúbicos por dia. Ela está gerando nos últimos meses, época de chuvas, 240 megawatts médios e usa 1,2 milhão de metros cúbicos por dia. Isso porque, no momento, o objetivo é dar segurança ao sistema, evitando apagões e exportando energia para o Sudeste. Na época da seca, quando a usina funciona em carga total, responde por 70% da demanda de Cuiabá.

(*) Com agências internacionais