Título: Vazamento de informação
Autor: Bottari, Elenilce e Ramalho, Sérgio
Fonte: O Globo, 26/04/2007, Rio, p. 14

A MÁFIA OFICIAL

Desembargador sabia por alguém do STJ que juíza pedira quebra do seu sigilo bancário.

Ex-vice presidente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região, o desembargador José Eduardo Carreira Alvim sabia que estava sendo alvo de investigação da Polícia Federal. Em conversa gravada por escuta instalada em seu gabinete, Carreira diz ao desembargador José Ricardo de Siqueira Regueira ter sido informado, por alguém do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sobre o pedido de quebra do seu sigilo bancário, encaminhado ao órgão pela juíza Ana Paula Vieira de Carvalho, da 6ª Vara Criminal Federal.

"Eu fui procurado e me contaram uma sacanagem, que a tal Ana Paula pediu ao STJ a quebra de meu sigilo bancário e o STJ indeferiu", disse Carreira ao também investigado José Regueira. Em seguida, Carreira alega que o pedido foi indeferido. "Porque Gonçalves é meu amigo", diz ele. De acordo com o relatório da PF, Carreira referia-se "provavelmente ao ministro Fernando Gonçalves, coordenador-geral da Justiça Federal do STJ". A hipótese de vazamento de informações no STJ é reforçada por outros trechos da escuta ambiental. Num dos diálogos, Carreira afirma a Regueira que seus telefones estão grampeados e pede ao desembargador informações sobre métodos para evitar as interceptações.

A conversa entre os dois ocorreu entre 14h47m e 16h9m do dia 25 de outubro. Temendo falar ao telefone, Carreira pede à sua secretária que vá chamar Regueira em seu gabinete. No diálogo de quase uma hora e meia, os desembargadores - presos durante a Operação Hurricane, acusados de negociar sentenças favoráveis à máfia dos bingos - reclamam da postura da juíza e a xingam.

Ministros negam ligação com acusado

Carreira diz que, se Ana Paula não fosse titular da vara, mandaria a juíza ao "raio que a parta". Ele diz a Regueira que xingou quem o estaria escutando, para mostrar que já sabia dos grampos em seus telefones. O desembargador pediu ao desembargador que evitasse levar a ele novos pedidos de liminar referentes a bingos. Durante o mesmo encontro, Regueira pergunta a Carreira por "Maria Thereza" (identificada no relatório da PF como ministra do STJ) e ele responde que também procurou por ela, por telefone, para pedir informações sobre o processo e cópias da degravação. No entanto, ela teria dito não estar com o caso. A ministra seria Maria Thereza Rocha de Assis Moura.

Um outro ministro do STJ, Paulo Medina, é investigado pela PF dentro da Operação Hurricane. Ele é suspeito de ter vendido sentença em favor da máfia dos bingos. O irmão dele, o advogado Virgílio Medina, está preso, sob acusado de ter intermediado a venda.

Os ministros Fernando Gonçalves e Maria Thereza, que supostamente aparecem nas transcrições das gravações, de acordo com a análise da PF, negaram com veemência qualquer relação com o caso ou com Carreira. Fernando Gonçalves, por meio da assessoria de imprensa do STJ, negou qualquer contato com Carreira. Gonçalves disse que desafia quem quer que seja a provar que ele teve qualquer contato com o desembargador. O ministro disse, inclusive, que coloca o seu sigilo telefônico à disposição, para mostrar que não teve contato com Carreira. Gonçalves lembrou que é secretário-geral da Justiça Federal e não tem acesso a processos como o de pedido de quebra do sigilo bancário - e, ainda que tivesse, não seria maluco de divulgá-los.

A ministra Maria Thereza também não quis dar entrevista. Por intermédio da assessoria de imprensa do STJ, informou que não conhece pessoalmente o desembargador Carreira Alvim. Afirmou que nunca falou com ele, nem como ministra, nem como advogada. Ela garantiu, segundo a assessoria, que só conhece o desembargador de nome.