Título: Na vila, falta trabalho e cresce prostituição infantil
Autor: Awi, Fellipe
Fonte: O Globo, 29/04/2007, O País, p. 8

Em Serra Pelada, moradores sofrem com falta de escolas e perspectiva de mecanização da extração do ouro.

CURIONÓPOLIS (PA). Nos últimos anos, a praga mais preocupante de Serra Pelada é a prostituição infantil. Seu crescimento, que já mobilizou o Ministério Público do Pará, é resultado da combinação de duas realidades: homens solitários que deixaram a família em suas cidades para procurar ouro e meninas com poucas perspectivas profissionais. Serra Pelada tem uma escola de ensino fundamental (até a oitava série). O ensino médio é feito em sistema modular, com professores de Belém e Parauapebas que fazem rodízio de um mês na vila. Há pouco trabalho e é preciso procurar outra cidade para fazer faculdade.

- Temos que sair daqui para conseguir alguma coisa na vida - diz Alessandra de Souza, de 19 anos, que sonha cursar direito em Marabá.

Vila tem um único comprador de ouro

A maioria das pessoas tem planos de sair da vila, se não por opção, por necessidade, uma vez que o garimpo mecanizado deverá forçar a desapropriação dos barracos de Serra Pelada. Mas não é por saudades antecipadas que alguns garimpeiros continuam procurando ouro, apesar de a lavra estar oficialmente proibida pelo governo federal. Com a ajuda de chupadeiras - máquinas de sucção -, gente como Osvaldo Pereira fica dias para retirar dois ou três gramas do metal da montoeira, como é chamada a montanha de resíduos tirados da principal cava de Serra Pelada.

Nos bons tempos, o lugar ganhou o apelido de FMI, mas hoje o banco estaria quebrado. No trabalho, eles mergulham numa água completamente contaminada de mercúrio. É o garimpo de subsistência, cuja cadeia de produção mantém o único comprador de ouro que restou na vila. Enquanto espera a indenização, Moacir Martins compra o grama a R$37 e vende para uma empresa de Curionopólis com 10% de lucro. É insuficiente para pagar aos agiotas que lhe permitiram começar o negócio:

- Quando sair o nosso dinheiro, pago a todo mundo e volto para o Rio Grande do Norte. Como eu nunca bamburrei, só assim terá valido a pena passar tantos anos preso aqui.

São tantas histórias tristes relatadas em Serra Pelada que a de Juvenal Carvalho só difere das outras por ser mais antiga. Como um jogador de cassino, ele investiu na área os 19 quilos de ouro que ganhou em outro garimpo, em Mato Grosso. No Pará, aprendeu o que é ser dono de barranco cego, aquele que não dá ouro. Perdeu tudo, menos a esperança, insuflada quando exibe uma pepita de 39 gramas achada recentemente por um amigo. Nessa hora, ele sorri e dá a resposta mais original sobre como será seu futuro depois que a indenização for paga.

- Vou fazer um check-up geral para voltar a ser um menino de 50 anos, se é que você me entende.