Título: Aflição e encanto com o juridiquês do Supremo
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 29/04/2007, O País, p. 14

Taquígrafas da corte admiram vocabulário dos ministros, mas leigos saem das sessões assustados com o estilo.

BRASÍLIA. A primeira sessão no Supremo Tribunal Federal (STF) não se esquece. Para o público leigo, assistir aos debates dos 11 integrantes da mais alta corte do Judiciário implica prestar a máxima atenção e, ainda assim, corre-se o risco de perder boa parte do conteúdo discutido. O vocabulário rebuscado e técnico, o abuso da ordem indireta nas frases, os termos em latim, as citações em outras línguas, sem falar no chamado "juridiquês" - tudo isso assusta. Mas também se transforma logo em cotidiano para quem vive no meio. É o caso das 22 taquígrafas que registram cada murmúrio emitido pelos ministros durante as sessões. Elas acham linda a forma como os magistrados se expressam.

- Eles têm coerência. Parece que estão lendo um livro, mesmo quando falam de improviso. A concordância, o pensamento, sai tudo tão certinho - elogia a supervisora da taquigrafia do STF, Silvana Gomes da Costa, há 30 anos no tribunal.

Na quinta-feira, embora a taquigrafia não tenha encontrado dificuldade em reproduzir nos bloquinhos de papel a fala dos ministros, muitos dos presentes estranharam o uso cerimonioso que se faz da língua portuguesa na corte. Um dos itens da sessão foi a possibilidade de se liberarem cópias do inquérito da Operação Hurricane para outros órgãos do Judiciário.

- Tenho (para mim) que se desvanecem as objeções. Está nela, por pressuposto, afastada a idéia de fraus legis ou fraus constituiciones, que o juízo da prova poderia, em caso contrário, abortar - disse o relator, Cezar Peluso, em certo momento.

Indagado pelo GLOBO, um dos presentes à sessão admitiu que não entendera muito bem a frase. Peluso, aliás, é um dos ministros que dão certo trabalho até para a taquigrafia. Fala muito rápido. Nada que as profissionais não consigam captar - passaram por concurso que exigia a transcrição de, no mínimo, 120 palavras por minuto por meio dos símbolos milenares da taquigrafia. Também afligem as falas de Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa, pelas citações em alemão e em francês, respectivamente. Fora isso, as moças garantem que o trabalho flui bem.

- Gosto como o Marco Aurélio de Mello se expressa. É claro e fácil de anotar. E Sepúlveda Pertence é sempre bem-humorado - diz Silvana.