Título: Um ano depois, país continua refém da Bolívia
Autor: Barbosa, Flávia e Tavares, Mônica
Fonte: O Globo, 29/04/2007, Economia, p. 31

Alternativa de importar GNL para diminuir dependência do gás boliviano esbarra em licenciamento ambiental.

BRASÍLIA e RIO. As iniciativas para reduzir a dependência que o Brasil tem do gás natural da Bolívia caminharam a passos lentos desde o decreto de nacionalização das reservas no país vizinho, que completa um ano no dia 1º de maio. O nível de dependência continua o mesmo: metade do gás consumido no país vem da Bolívia. E há novos entraves pela frente. O projeto para a Petrobras importar, por navios, 20 milhões de metros cúbicos de gás natural liquefeito (GNL) ¿ na forma líquida ¿ corre riscos de atrasar por problemas de licenciamento ambiental.

Além de a Petrobras ter levado quase 12 meses para dar início ao plano de importação de GNL com terminais flutuantes nos próprios navios de regaseificação, ainda vai ter que enfrentar uma maratona para obter a licença prévia do Ibama e da Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (Feema) para atracar os navios em Pecém (CE) e na Baía de Guanabara, o que pode levar mais um ano. O plano é ter condições de importar até 20 milhões de metros cúbicos por dia de GNL a partir de 2008. Hoje, o consumo brasileiro de gás natural é de cerca de 50 milhões de metros cúbicos diários.

Para o advogado Paulo Valois, especialista em petróleo e gás do escritório Schmidt, Valois, Miranda, Ferreira e Agel, o conflito ocorrido na semana passada na Bolívia, que interrompeu uma parte do gás vendido ao Brasil, mostrou que o país continua tão dependente das importações do gás boliviano como há um ano.

¿ Faltou um negociador de peso que adotasse uma postura mais firme. O Brasil está refém da Bolívia ¿ disse Valois.

A Petrobras calcula que somente em dezembro do ano que vem conseguirá aumentar a oferta de gás em 24 milhões de metros cúbicos por dia, volume praticamente igual ao atualmente importado da Bolívia.

Petrobras ainda não entregou estudo de impactos

O planejamento da estatal de começar a operação das unidades no primeiro semestre de 2008 é apenas uma vontade. O cronograma mais apertado é o do navio-terminal para o píer do Porto de Pecém. A Petrobras já deu entrada no processo de licenciamento e, após reuniões com os técnicos do Ibama, já obteve o Termo de Referência. Este é o guia do órgão com tudo o que a estatal precisa apresentar no EIA-Rima ¿ levantamento dos possíveis impactos ambientais da instalação do terminal flutuante de regaseificação.

A Petrobras, entretanto, ainda não o entregou. O Ibama só começa a análise do processo a partir deste estudo. De acordo com o órgão, sua equipe terá de seis meses a um ano para concluí-la ¿ incluindo o período de consulta pública, e considerando-se que não serão solicitadas informações complementares. Só então sairia uma licença prévia para o empreendimento. Cumprida essa etapa ¿ que permite apenas o início das obras ¿, outras condições têm de ser observadas até a obtenção da licença de instalação.

¿ O bom andamento do processo depende da empresa ¿ afirmou uma fonte do Ibama.

Na Feema, a análise de documentos e do projeto deverá levar, na melhor das hipóteses, seis meses, avalia Dyrton Bellas, analista ambiental do órgão. O projeto de terminal flutuante na Baía de Guanabara inclui ainda a instalação de um duto submarino e outro terrestre, que levarão o gás até a Refinaria Duque de Caxias (Reduc).

A Feema está na fase de análise do Estudo de Impacto Ambiental, entregue no fim de março pela Petrobras. Bellas disse que há um grupo dedicado ao projeto do GNL que vem conversando com os técnicos da Petrobras para sanar as dúvidas. Resolvidas as pendências, será marcada a audiência pública, quando a Petrobras apresentará o projeto, e a Feema, a avaliação ambiental. Numa tentativa de acelerar o processo, o órgão já informou os Ministérios Público Federal e Estadual, além da Prefeitura de Caxias e a Capitania dos Portos, que precisa saber que haverá navios entrando e saindo da baía transportando o GNL.

A importação do GNL é a parte de execução mais rápida do Plano de Produção Antecipada de Gás (Plangás), anunciado em maio de 2006 para conseguir a auto-suficiência do abastecimento do gás natural no país e a independência em relação ao produto importado da Bolívia.

A produção de gás natural, segundo a Petrobras, deverá atingir 70 milhões de metros cúbicos por dia em 2011. Para isso, a companhia e seus parceiros privados estão investindo US$22,4 bilhões, dos quais US$17,9 milhões da Petrobras, entre 2007 e 2011. A previsão é que até o fim deste ano algumas plataformas na Bacia de Campos comecem a produzir gás natural, e a oferta do produto chegue a 34,1 milhões de metros cúbicos diários. Segundo um dirigente da Petrobras, todo esforço está sendo feito para conseguir aumentar a oferta em mais 24,2 milhões de metros cúbicos por dia de gás em dezembro do próximo ano.

SEPARATISTAS SE ARMAM NA BOLÍVIA, nas páginas 39 e 40