Título: Clero da AL se aproxima do Vaticano
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 07/05/2007, O País, p. 5

Após duas décadas de tensão, novos líderes têm bom diálogo com a Santa Sé.

BRASÍLIA. Após duas décadas de distanciamento e uma relação pautada pelo conflito, a Igreja na América Latina volta a se aproximar do Vaticano. Especialistas e teólogos consideram a Conferência de Aparecida um novo marco desse relacionamento. O avanço nas relações dos católicos da região com a Santa Sé é fruto de um novo diálogo e da renovação das lideranças católicas latino-americanas, que ainda têm, em vários países, perfil conservador.

¿ As rusgas terminaram. O episcopado latino-americano passou a ter uma sintonia fina com Roma. O Vaticano mudou e compreendeu a realidade de quase meio bilhão de católicos na região e as diferenças em relação à Europa ¿ observa o teólogo e ouvidor da PUC-SP, Fernando Altemeyer.

Diferentemente de um passado recente, no qual estava sob o comando de cardeais de perfil conservador, o momento atual é de predomínio de líderes moderados e progressistas na região. Exemplo dessa mudança foi a nomeação do cardeal brasileiro Cláudio Hummes como prefeito da Congregação para o Clero, em dezembro do ano passado.

¿ Nas últimas décadas, a Igreja da América Latina estava mal representada no Vaticano. Os cardeais que estavam lá não representavam a Igreja. Houve um clima de suspeição, que parece ter acabado. Atualmente, surgem cardeais mais despidos de preconceitos, mais abertos e com maior possibilidade de mediação ¿ diz o bispo de Jales, dom Demétrio Valentini.

O vice-presidente do Conselho Episcopal Latino-Americano, dom Geraldo Lyrio, recém-eleito presidente da CNBB, não crê ter havido um distanciamento em relação a Roma, mas concorda que houve tensão. Ele atribui o conflito a divergências quanto à Teologia da Libertação.

¿ O Concílio (Vaticano II) provocou grande efervescência na Igreja, o que resultou em atitudes radicais de progressistas e conservadores. As posições da América Latina no campo teológico provocaram momentos de tensão, principalmente com os setores da Santa Sé responsáveis pela doutrina ¿ observa ele, numa referência a ação do então cardeal Joseph Ratzinger.

Hoje, além de dom Cláudio Hummes, outros líderes têm papel importante na América Latina nessa nova fase. Influente na Argentina, o cardeal-arcebispo de Buenos Aires, Jorge Bergoglio, foi forte concorrente no último conclave. Progressista, o jesuíta lançou um livro no qual condena a ditadura.

Outra liderança é o arcebispo de Tegucigalpa, Oscar Rodríguez Maradiaga. Mesmo progressista e aberto nas questões ecumênicas, sempre teve um bom diálogo com a Santa Sé.

Entre os moderados outros três cardeais são estrelas em ascensão: o atual presidente da Celam, o chileno Francisco Errázuriz; o arcebispo de Havana, Jaime Lucas Ortega y Alamino, conhecido por sua habilidosa oposição ao regime de Fidel Castro; e o arcebispo de Caracas, Jorge Urosa Savino, que rebateu a tese do presidente Hugo Chávez de que Jesus era ¿socialista¿.

Apesar da mudança de perfil no comando da Igreja na região, os conservadores permanecem influentes, principalmente em Colômbia, Peru e México. O grupo é liderado pelo cardeal colombiano Alfonso López Trujillo. (Gerson Camarotti)