Título: Ibama: acúmulo de sedimentos pode prejudicar funcionamento de usinas
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 06/05/2007, Economia, p. 36
POLÊMICA VERDE: Ministério discorda de parecer do instituto sobre as obras.
Ibama: acúmulo de sedimentos pode prejudicar funcionamento de usinas.
Complexo hidrelétrico põe em risco a sobrevivência de cinco mil pessoas.
VILA DE SANTO ANTONIO, CACHOEIRA DO TEOTÔNIO E PORTO VELHO (RO). O principal obstáculo que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) vê para conceder a licença ambiental às obras do complexo hidrelétrico do Rio Madeira se refere ao acúmulo de sedimentos na barragem, que poderia colocar em risco o funcionamento da usina e comprometer seu tempo de vida útil. Para o órgão, o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente (Rima) encaminhados pelo consórcio Furnas-Odebrecht ao governo não esclarecem essa questão.
O parecer do Ibama, que pede novos estudos de impacto ambiental, afirma que pode haver o assoreamento muito rápido, principalmente da usina de Jirau, próxima à Bolívia, e a área inundável pode ser maior que a prevista no projeto. Para o Ibama, o EIA-Rima do consórcio não fez pesquisa suficiente, exaustiva e necessária a respeito da sedimentação.
"Não foram alcançados níveis mínimos de confiabilidade para essa etapa de viabilidade ambiental", diz o parecer do órgão.
MP prevê queda de renda de pescadores e garimpeiros
O Ministério das Minas e Energia contesta a idéia de que os sedimentos comprometerão o funcionamento das duas usinas ou que seu tempo de vida útil será menor. O secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético do ministério, Márcio Zimmermann, em audiência pública na Câmara dos Deputados na última quinta-feira, em Brasília, informou que não há risco de problemas com sedimentos.
Segundo ele, estudos demonstram que o material do fundo do Rio Madeira é composto de grãos de areia de um milímetro de diâmetro, e cálculos asseguram que o rio tem capacidade de transportar até dois milímetros de diâmetros de areia. Zimmermann garantiu ainda que a vida útil do reservatório não está comprometida.
Uma análise do EIA-Rima do consórcio feita por uma empresa contratada pelo Ministério Público estadual de Rondônia, que contesta a obra, apontou outros problemas, como o impacto das turbinas nas ovas e larvas de peixes. A Procuradoria levanta também aspectos sociais, como a sobrevivência de pescadores e garimpeiros, em conseqüência da redução de renda e de emprego após a construção das usinas. O estudo aponta que cerca de cinco mil pessoas serão afetadas, direta e indiretamente, em seus empregos nas várias localidades à beira das hidrelétricas. O próprio estudo apresentado por Furnas-Odebrecht listou uma série de impactos das obras, dizendo que serão sanados. O EIA-Rima classificou esses impactos como "muito altos", como a interferência na rota de desova dos peixes, na perda de vegetação e no aumento da incidência de malária na região. Entre os impactos considerados "altos" estão a queda no emprego e na renda dos garimpeiros e a redução de outras atividades econômicas.
O documento também lista os benefícios para a população de Rondônia, entre elas a elevação da oferta de energia elétrica, o aumento da renda do setor público e a dinamização das atividades econômicas.
Para tecelão, usina afetará sobrevivência das famílias
O líder indígena Antenor Karitcuna, filiado ao PT e candidato derrotado a deputado estadual em 2006, defende a construção da usina. Ele vem da aldeia Karitcuna, localizada a cem quilômetros de Porto Velho, onde vivem cerca de 400 índios:
- A hidrelétrica vai trazer desenvolvimento e melhorar a vida de meu povo. Esses ambientalistas que criticam, todos têm dinheiro e não deveriam impedir que outros povos tenham acesso ao progresso.
Mário Pereira da Silva, tecelão de tarrafas em Cachoeira do Teotônio, pensa o contrário. Para ele, a usina acabará com o ganha-pão de famílias que sobrevivem da pesca no local:
- Em que outro lugar eu poderia sobreviver com esse meu trabalho?