Título: Informalidade e discriminação
Autor: Melo, Liana
Fonte: O Globo, 06/05/2007, Economia, p. 38

Apoio da população a Morales ainda é alto, mas vem caindo.

LA PAZ. Os Quispe Huallpa formam uma típica família matriarcal. Juana, de 50 anos, vive em El Alto, na periferia de La Paz. Ela, a filha Lucy e a neta Catari são parte das 650 mil pessoas que moram nesse bairro, que teve seu boom de crescimento nos anos 80. Hoje, El Alto, que tem quatrocentas comunidade indígenas, é o retrato do que o crescimento desordenado pode fazer com um lugar. As moradias são inadequadas e a falta de infra-estrutura é regra.

Juana descende de índio. Ela, a filha e a pequena Catari, de seis meses, sobrevivem das vendas de uma papelaria informal da família. Lucro é uma palavra de que elas riem. O dinheiro, dizem, só dá para repor mercadoria.

¿ Ganhamos 30 pesos bolivianos por dia ¿ calcula Lucy.

Na casa, além das três, vivem mais quatro filhos de Juana. Lucy é a mais velha. Tem 18 anos, não completou os estudos e já é mãe. Diz que não gosta de política. Não chega a falar mal de Evo Morales, mas acha que ele está fazendo pouco pelos carentes. Lucy não acredita que um dia conseguirá emprego e parece conformada. Se pudesse, diz, mudaria de país.

O sapateiro Ramon Apaza, de 50 anos, também de El Alto, a mulher Maria e os quatro filhos vivem da renda proveniente do pequeno negócio no bairro. Há cinco anos, Apaza perdeu o emprego de operário na construção civil. A sapataria foi a alternativa. Ele torce o nariz quando ouve falar de Morales. Não se conforma de o presidente até hoje não ter feito uma campanha contra a discriminação social. Dois dos seus quatro filhos são engraxates em La Paz. Passam o dia escondendo o rosto com uma pasamontaña ¿ um gorro que cobre a cabeça, deixando os olhos de fora. É que alguns jovens preferem trabalhar assim para não serem identificados como pobres. É a forma que escolheram para se proteger da discriminação.

Apesar de tudo, Morales conta com um alto índice de aprovação, em torno de 60%, segundo pesquisa recente. Mas está perdendo o apoio. É que o boliviano tem pressa de mudança, como diz o taxista Alberto Sirpa, de 46 anos.