Título: Especialistas criticam acordo de editora com o Rei
Autor: Duarte, Alessandra
Fonte: O Globo, 05/05/2007, O País, p. 13

Para advogados de direitos autorais, não foi julgado o mérito das acusações feitas pelo cantor Roberto Carlos.

O fim da novela na Justiça sobre o livro ¿Roberto Carlos em detalhes¿ ¿ que, após um acordo entre o cantor Roberto Carlos e a editora Planeta, teve sua venda proibida e seus exemplares recolhidos ¿ foi interpretado como uma derrota para seu autor, o pesquisador Paulo Cesar de Araujo. Mas, para especialistas em direitos autorais, a polêmica não foi a derrota do autor, e sim o fato de a questão ter sido sequer decidida por um juiz. Para advogados, o acordo pode ser questionado na Justiça por uma ação cível. O processo contra a Planeta foi criticado por editores e escritores como Paulo Coelho, que chamou o cantor de infantil.

A falta do julgamento do mérito da questão, ou seja, se Roberto Carlos tinha ou não razão ao criticar o livro, é o ponto para o qual chama atenção a advogada Deborah Sztajnberg, integrante da Comissão de Direitos Autorais e Entretenimento da seção Rio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ).

¿ Cadê a verdade? Alguém provou que os fatos que Roberto Carlos critica são realmente inverídicos? O mérito não foi julgado, e isso, para nós da área de direitos autorais, choca ¿ afirma a advogada. ¿ O que fizeram com esse rapaz (o autor) é um absurdo. Agora você vai ter de viver apenas de livro de Harry Potter? Livros como este, ou como aquele ¿História sexual da MPB¿, são um registro histórico de personalidades do país. É um caso claro de direito à informação, e de censura a esse direito. A Planeta tinha poder econômico e jurídico para se defender, e não o fez.

A integrante da comissão da OAB destaca o fato de se tratar de uma pessoa pública:

¿ No momento em que você decidiu ser rei, recebeu o ônus da coroa. Há limites, claro, como o caso da Carolina Dieckmann, que processou o programa ¿Pânico na TV¿. Mas no caso desse livro não havia, por exemplo, chacota quanto à vida do biografado.

O professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) José Carlos Vaz e Dias, advogado do escritório Di Blasi, também diz que a questão deveria ter sido levada à decisão da Justiça, que teria de analisar o interesse público do que se está retirando do mercado:

¿ Se historiadores, associações ou outro tipo de comunidade, ou o próprio autor, sentirem-se prejudicados pelo acordo, podem entrar com uma ação questionando esse acordo na Justiça.

Comparando a legislação brasileira com a internacional, Deborah Sztajnberg afirma que ambas permitem a suspensão de venda de obras, desde que decidida por um juiz:

¿ Nos Estados Unidos, por exemplo, em que há várias biografias não autorizadas, quando os biografados processam os autores, a Justiça decide por indenizações por danos morais, pois considera que retirar a obra de circulação é inócuo: o eventual dano já teria sido feito, porque as pessoas já leram o livro. Aliás, o pagamento da indenização é feito com a vendagem da obra, que aumenta absurdamente com a polêmica criada.

Se em livrarias como Argumento e Travessa a biografia não está mais à venda, até o fim da tarde de ontem o site Amazon.com, estrangeiro, vendia a obra. Segundo a integrante da comissão de direitos autorais da OAB, a venda no exterior vai ferir o acordo caso a obra seja comprada por alguém do Brasil. Procurada pelo GLOBO, a editora Planeta não quis comentar o assunto.