Título: Novos protestos e um rastro de destruição
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 08/05/2007, O Mundo, p. 27

Centenas de carros são queimados e pessoas, presas. Distúrbios entram na 2ª noite

PARIS. As manifestações contra a vitória do conservador Nicolas Sarkozy entraram em seu segundo dia consecutivo, ontem, e estenderam-se pela madrugada de hoje em Paris e outras cidades francesas. Segundo a polícia, os protestos de domingo, segunda-feira e madrugada desta terça-feira deixaram um total de 730 carros queimados e 78 policiais feridos. Pelo menos 635 pessoas foram presas em todo o país. Depois de cerca de 500 pessoas irem às ruas de Paris para protestar contra Sarkozy durante o dia de ontem - entrando em choque com a polícia, destruindo janelas de lojas e cabines de telefone - outras 400 voltaram às ruas, à noite, destruindo também carros e motocicletas. Mais choques com a polícia foram relatados na região entre as praças da Bastilha e da República. O mesmo ocorreu nas cidades de Nantes (oeste), Lyon (leste) e Caen (norte).

Na Rue de Lyon, em Paris, Sophie Wolkowitch, 49 anos, dona da farmácia Grande Pharmacie du Départ, próxima à Gare (estação de trem) de Lyon, olhava, devastada, sua fonte de trabalho de 20 anos destruída pelos jovens na madrugada de ontem. Os manifestantes escolhiam os lugares ao acaso. Alguns sortudos escaparam. Mas Sophie foi premiada com o desastre: destruíram todos os vidros de sua farmácia, jogaram centenas de caixas de remédios nas calçadas e roubaram todos os computadores. Para essa parisiense, que passou a noite na casa de amigos comemorando a vitória de Sarkozy, em quem votou, o sucesso do direitista nas urnas teve um gosto amargo.

- Não sei como vou fazer...Estou enojada. Violência gratuita, para quê?

A destruição da farmácia de Sophie reforçou sua convicção de que é disso que a França precisa: um presidente como Sarkozy. Só com vidros quebrados, seu prejuízo é de 14 mil.

- Votei em Sarkozy para que ele ponha a França de volta ao trabalho e evite que estes pequenos idiotas venham quebrar nossas vitrines. Não são trabalhadores que fazem isso.

As manifestações, principalmente em Paris, são o retrato da França polarizada. Enquanto na Praça da Concórdia milhares de pessoas celebravam a consagração da direita com a vitória de Sarkozy, grupos de jovens se confrontavam com a polícia na Praça da Bastilha. O comércio da Rue de Lyon, que vai da praça até a Gare de Lyon, foi devastado: um salão de beleza foi inteiramente destruído, assim como bancos, revendedoras de carros, restaurantes. Dominique Fontaine, coreógrafa que mora no bairro, observou os estragos:

- Eu não estou de acordo com isso. Mas é preciso dizer que tem muita gente que não gosta de Sarkozy. Se você não respeita as pessoas e as chama de racaille (gentalha)... é nisso que dá. O respeito tem que vir dos dois lados.

Songin, 43 anos, dono de um restaurante chinês, fechou o seu negócio depois que passou o furacão pela rua, mas não conseguiu ir para casa dormir. Ficou assistindo ao desespero. Para ele, a França precisa aplicar o método chinês: disciplina em casa.

- É muito grave isso tudo. É preciso que os pais batam mais nos filhos e os eduquem como é preciso. (D.B.)