Título: Ato faz defesa da liberdade de imprensa
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Fonte: O Globo, 09/05/2007, O País, p. 14

Conclusão é que ainda há ameaças ao princípio no Brasil; presidente da ANJ rechaça regulamentação por lei

BRASÍLIA. Assegurada na Constituição e encarada como princípio geral da democracia, a liberdade de imprensa ainda sofre ameaças no Brasil. O desafio maior, porém, é o exercício diário dessa liberdade, com a definição ou não de limites para a livre circulação de informações, uma espécie de "sintonia fina" do direito à livre comunicação. Essas foram algumas das conclusões da 2ª Conferência Legislativa sobre Liberdade de Imprensa, realizada ontem na Câmara dos Deputados.

No evento, o presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Nelson Sirotsky, fez uma defesa da liberdade de imprensa. Ele rechaçou qualquer idéia de regulamentar o tema por lei ou pela ação de uma agência ou órgão específico. Para o presidente da ANJ, é o diálogo com a sociedade e o dia-a-dia do exercício da liberdade de imprensa que devem orientar o caminho:

- Esta nova etapa é extremamente complexa. Mas não precisamos de mais leis, órgãos, institutos ou organizações para que possamos regulamentar a complexidade do momento que vivemos. Não é com leis, mas com a prática, a abertura e o diálogo.

A conferência reuniu jornalistas brasileiros e estrangeiros, donos de jornais, deputados e dirigentes da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), que promoveu o evento com a ANJ.

O deputado e ex-presidente da Câmara Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), que teve seu mandato cassado por suspeita de irregularidades no rastro da CPI do Orçamento, em 1994, disse que é melhor conviver com os excessos da mídia do que restringir sua atuação. Segundo ele, a história mostra que restrições acabam tendo efeito pior:

- Toda a vez que se inventou uma imprensa comportada, assim como um Parlamento comportado, o resultado foi uma ditadura asséptica, anódina.

O representante da Unesco no Brasil, Vincent Defourny, também afirmou ser contra a aprovação de lei para regular a liberdade de imprensa. Ele disse ser simpático a iniciativas como a do Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar):

- O importante é que haja mecanismos de auto-regulação dentro dos meios de comunicação. O Conar é interessante.

O deputado Paulo Renato Souza, que foi ministro da Educação no governo Fernando Henrique, disse já ter sido vítima da imprensa, mas acha positivo o saldo para o país:

- Exageros e injustiças foram cometidas, pessoas foram crucificadas, mas me parece que o país avançou como um todo.

O presidente da Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), que ameaçou processar o comentarista político e cineasta Arnaldo Jabor por críticas contra os parlamentares, defendeu a liberdade de imprensa como valor inerente à democracia. Mas ressaltou que se deve agir com responsabilidade e seguir a ética que rege o setor.

O vice-presidente José Alencar disse que o diagnóstico da liberdade de imprensa na América Latina é preocupante:

- Não há pessoas nem sociedades livres sem o exercício da liberdade de imprensa.

Os deputados José Eduardo Cardozo (PT-SP) e Chico Alencar (PSOL-RJ) e o ex-secretário de Imprensa de Lula Ricardo Kotscho defenderam a liberdade de imprensa, mas disseram que é preciso haver alguma regulação ou ponto de equilíbrio entre a liberdade de informar e o direito à dignidade, assim como a responsabilização dos jornais por erros cometidos.

- A imprensa não pode ser terra de ninguém em que cada um faz suas próprias leis - disse Kotscho.

- A liberdade de imprensa só tem sentido se ajudar na capilarização da cidadania - afirmou Alencar.

Cardozo disse que o assunto desperta reações passionais e, por mais importante que seja, a liberdade de imprensa deve ter limites. Afirmou, porém, ser contra a definição dos limites em lei. Para ele, só a discussão pública a partir de casos concretos pode fazer o país avançar.

Em entrevista depois do evento, o ministro do Supremo Tribunal Federal Sepúlveda Pertence reclamou que muitas vezes o Judiciário é visto pela opinião pública como lento e ineficiente por existirem "tempos diferentes" entre a imprensa e o processo jurídico.