Título: De cara para o gol
Autor: Santos, Ana Cecília e Eloy, Patricia
Fonte: O Globo, 11/05/2007, Economia, p. 27

Fitch coloca Brasil a um passo do grau de investimento. Para analistas, é preciso fazer reformas.

Otão cobiçado grau de investimento (investment grade), classificação dada por agências especializadas a países seguros para aplicar recursos, está agora mais próximo do Brasil. A Fitch saiu na frente e elevou ontem a nota do país de BB para BB+, a um passo do nível de recomendação de investimento. A melhora do rating aumenta o fluxo de recursos para o país, que paga juros menores em captações no exterior, beneficiando também as empresas. E foi o que aconteceu ontem, quando o Brasil emitiu R$750 milhões em bônus em moeda brasileira com vencimento em 2028 com taxa de retorno para o investidor de 8,938% ao ano - o menor custo já registrado para bônus em reais.

Nas outras duas agências, Moody"s e Standard&Poor"s, o Brasil ainda está a dois níveis do grau de investimento na nota de crédito em moeda estrangeira - e a expectativa dos analistas é de que elevem a classificação até o fim do ano. Para um país, ser investment grade é importante porque muitas instituições têm por regra aplicar apenas em títulos de nações com essa classificação, caso dos poderosos fundos de pensão americanos.

No comunicado oficial, a Fitch afirma que a elevação reflete a melhora na situação externa do país, políticas macroeconômicas prudentes e um aumento da poupança doméstica. Mas ressalta que reformas estruturais, como a fiscal e a autonomia do Banco Central, poderiam sustentar uma expansão maior. O diretor-executivo da Fitch no Brasil, Rafael Guedes, diz que atingir o grau de investimento exigirá um sinal claro de que a dívida pública será reduzida de forma sustentável.

Mantega: dólar vai cair mais

O analista Luís Eduardo Costa, estrategista de dívida de países emergentes do ING em Londres, também destaca a necessidade de reformas:

- Quanto mais falarmos sobre o país atingir o grau de investimento nos próximos anos, maior será a pressão por reformas sobre o governo Lula. E esse é um grande problema hoje.

Já na avaliação de Alexandre Horstmann, sócio da Meta Asset Management, o Brasil já poderia ter atingido o investment grade se não fosse o conservadorismo das agências:

- O Brasil está numa rota de crescimento sustentável de 4% a 4,5% pelos próximos dois anos. Com isso, a relação dívida/PIB tende a melhorar.

A equipe econômica comemorou a decisão da Fitch. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, ressaltou o reconhecimento da solidez da economia, mas admitiu que será um incentivo adicional à desvalorização cambial, pois estimula o fluxo de dólares para o país:

- É o chamado preço do sucesso. O problema que se coloca é inevitável. Se você está melhor, você vai atrair mais investidores.

O secretário do Tesouro Nacional, Tarcísio Godoy, minimizou o impacto sobre o câmbio:

- Não posso achar ruim a gente virar grau de investimento.

De Londres, onde participa de reuniões com investidores, o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, rebateu a crítica de especialistas de que o custo de manutenção das reservas internacionais - hoje em quase US$123 bilhões - é alto. Só este ano, as reservas cresceram cerca de US$37 bilhões, basicamente com fortes compras de dólares no mercado.

- A decisão da agência é uma prova concreta de que a redução do risco-país e dos custos de financiamento do Tesouro Nacional e das empresas, em função do aumento das reservas internacionais, traz ganhos significativamente superiores ao custo de carregamento das reservas - afirmou.

Em relatório enviado a clientes, Darwin Dib, do Departamento Econômico do Unibanco, lembra que "o Brasil nunca esteve tão perto de entrar na lista de países de primeiro time no que diz respeito a avaliação de risco". Mas, segundo Dib, as contínuas intervenções do BC no mercado de câmbio podem ser um sério obstáculo. Isso porque, ao comprar dólares no mercado - adquirindo moeda estrangeira e dando em troca reais - o BC precisa emitir títulos em moeda local, para enxugar os recursos excedentes no mercado financeiro. O problema é que uma das maiores preocupações das agências de risco é justamente a solvência da dívida pública interna, que impõe amarras a um crescimento mais robusto.

Embora positiva para os investidores, a melhora da nota da Fitch não provocou reação dos mercados financeiros, que já trabalhavam com essa possibilidade. A Bolsa de Valores de São Paulo fechou em queda de 2,08%, acompanhando o mercado externo. O dólar subiu 0,29%, para R$2,024, ajudado pelo leilão de compra do BC no mercado à vista. O risco-Brasil subiu 2,64%, para 155 pontos centesimais.

A emissão dos títulos em reais no exterior foi estendida ainda ontem ao mercado asiático. Neste caso, o Brasil pretende captar até R$37,5 milhões. De acordo com o Tesouro Nacional, quando esse papel foi lançado no mercado, em fevereiro de 2007, a taxa de retorno para os aplicadores chegou a 10,68% ao ano. Os títulos emitidos ontem terão juros de 10,25% ao ano e foram ofertados a 112,25% de seu valor de face. Ou seja, os investidores também aceitaram pagar um ágio para adquirir os bônus. Por isso o retorno final para o comprador é menor.