Título: Bolívia pagará US$112 milhões por refinarias
Autor: Oliveira, Eliane e Tavares, Mônica
Fonte: O Globo, 11/05/2007, Economia, p. 30

Forma de pagamento não está decidida: Petrobras poderá receber em duas parcelas ou até mesmo em gás natural.

BRASÍLIA e RIO. Após cinco dias de tensas negociações, a petrolífera YPFB aceitou pagar US$112 milhões à Petrobras pelas duas refinarias que a estatal brasileira possui na Bolívia e que foram expropriadas em 1º de maio de 2006. No entanto, o ministro de Minas e Energia, Silas Rondeau, afirmou que a forma de pagamento ainda não está decidida. O Brasil cedeu mais uma vez e concordou em discutir a melhor maneira de receber. Por exemplo, pode haver duas parcelas ou mesmo o ressarcimento em gás natural. A Petrobras, no entanto, nega que aceitará receber gás.

O gerente-executivo da Petrobras no Cone Sul, Décio Oddone, disse que a empresa não saiu perdendo com o acordo com a YPFB. Segundo ele, o valor acertado é compatível com as projeções de mercado feitas pela estatal na época da compra e a realidade atual.

- Quando você entra em um negócio, você não compra pelo valor que ele tem, mas pelo fluxo de caixa que ele vai trazer. É como um apartamento: avaliamos o aluguel que poderá ser pago mês a mês e sua valorização - explicou - Compramos (as refinarias), recebemos fluxo de dinheiro ao longo desses anos e vendemos pelo que consideramos sem prejuízo.

Rondeau disse ainda que a Petrobras dará à Bolívia todo o apoio operacional necessário. Em tese, com a saída da empresa, a YPFB ficaria sem o know-how do negócio de refino. O ministro disse, porém, que 95% dos funcionários das refinarias já são bolivianos.

- Foi um negócio justo para as duas partes. Não houve queda-de-braço. Houve negociação, na qual chegamos a bom termo - afirmou Rondeau, após se reunir com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que deu aval ao acordo.

A Petrobras aplicou nas duas unidades US$134 milhões desde a compra, no fim da década de 1990, e queria recuperar o máximo do investimento - embora fontes garantam que o montante tenha chegado a US$180 milhões. Por isso, sua proposta inicial, segundo fontes do governo, era receber em torno de US$160 milhões (Rondeau e a Petrobras negam). A Bolívia insistia em pagar US$60 milhões. Diante das discussões, a Petrobras decidiu, na noite de terça-feira, baixar o preço e tratar a oferta como final. Mas o ministro negou que a estatal tenha amargado prejuízo:

- A Petrobras certamente não perdeu dinheiro nesta jogada. A presença da Petrobras na Bolívia não foi um mau negócio.

Pela manhã, o presidente boliviano, Evo Morales, elogiou o "desprendimento" de Lula, sugerindo sua participação ativa na negociação:

- O mais importante para nós é que existe esse desprendimento do presidente Lula de devolver as refinarias ao povo boliviano.

Rondeau exaltou o gesto político de Morales, de indenizar a Petrobras por um valor superior ao pago pelas unidades (US$104 milhões, sem contar investimentos). Ele negou que a iniciativa de baixar o preço final tenha sido ordenada por Lula:

- O presidente Lula deu toda a autonomia à Petrobras, enquanto empresa responsável por seus resultados, para que apostasse na via da negociação. Ele não entrou na questão de preço.

A proposta da Petrobras foi aceita pelos bolivianos ontem de manhã. Na parte da tarde, porém, a YPFB pediu que o pagamento fosse feito em duas parcelas, o que postergou as discussões e a divulgação do resultado final. Para acertar as condições do ressarcimento, será criada uma comissão, com integrantes dos dois países.

Rondeau não sabia dizer se já há propostas na mesa, mas acenou que há disposição da Petrobras em ser generosa. Por exemplo, na assinatura do contrato de venda seriam pagos 50% do valor, sendo o restante quitado dois meses depois:

- Tudo é possível, inclusive pagar em gás. É um produto que nos interessa, e nós temos um contrato de 30 milhões (de metros cúbicos de fornecimento diário). Portanto, aí nós temos uma boa garantia.

Outra alternativa era apelar a tribunal internacional

O acordo é o desfecho do ultimato dado pela Petrobras na segunda-feira - com respaldo do governo brasileiro, que, em nota oficial, demonstrou descontentamento com o decreto que tirava da empresa o controle da exportação de derivados de petróleo e sugeriu a adoção de retaliações. A estatal anunciou naquele dia que se retirava da atividade de refino na Bolívia e avisou que, caso os bolivianos não aceitassem sua proposta de remuneração por 100% dos ativos, recorreria à arbitragem internacional.

Para o especialista Marco Tavares, da consultoria Gas Energy, um acordo é sempre melhor do que levar o problema à arbitragem internacional, o que consumiria tempo e dinheiro:

- E qual é a garantia de que a Bolívia vai cumprir uma decisão judicial? O que se vê é um país que rompe contratos. Sempre é melhor um acordo, mesmo que não seja perfeito.