Título: Saúde para comprar brigas e criar polêmicas
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 13/05/2007, O País, p. 10

Há 40 dias no cargo, Temporão se notabilizou por defender discussão sobre aborto e anunciar quebra de patente.

BRASÍLIA. Há apenas 40 dias no cargo, o ministro da Saúde, o médico sanitarista José Gomes Temporão, conquistou um espaço dentro do governo, e também na imprensa, que poucos auxiliares do presidente Lula alcançaram em tão pouco tempo. Uma notoriedade obtida ora por medidas de impacto do governo - como a quebra da patente de um medicamento anti-Aids -, ora por estar no centro de polêmicas, como a da legalização do aborto.

Temporão comprou brigas com os setores mais diversos. Ele desagradou à Igreja ao propor plebiscito sobre o aborto e foi alvo de uma passeata de religiosos conservadores. O ministro atacou também a proliferação descontrolada de farmácias pelo país e acusou esses estabelecimentos de venderem bugigangas e sandálias, em vez de promover políticas de saúde.

O ministro encerrou a semana desafiando setores de comunicação e publicidade incomodados com sua iniciativa de regulamentar a propaganda de bebidas alcoólicas. Ele anunciou que comprará essa briga. Quer proibir artistas e atletas de estrelar esse tipo de campanha publicitária.

Briga agora com ações judiciais de pacientes

Temporão não pára e já mira em outros alvos. Ele quer solução para conter o grande número de ações judiciais de pacientes, que recorrem ao Judiciário para ter acesso a medicamentos caros, de alta complexidade e que precisam ser importados. Somente este ano, o governo deverá pagar R$25 milhões na compra desses remédios, um gasto quase equivalente à economia de R$30 milhões com o licenciamento compulsório do Efavirenz, remédio do coquetel de combate à Aids.

Quando perguntado sobre os mais variados temas, ele tem um estilo bate-pronto. Durante encontro no Conselho Nacional de Saúde, na quinta-feira, não economizou palavras. Perguntado por um representante de portadores de deficiência sobre a política para essa área, respondeu:

- É lamentável que uma pessoa dependa de doação de um animador de auditório para obter uma cadeira de rodas.

Outro conselheiro levantou o tema da pesquisa com célula-tronco, que está sendo contestada no Supremo Tribunal Federal (STF).

- Seria um gigantesco retrocesso (o veto à pesquisa). Colocaria o Brasil numa posição muito delicada. Outros países estão investindo em pesquisa e temos capacidade científica para avançar - disse, sem receio de ter uma posição firme sobre um tema que pode, novamente, confrontá-lo com a Igreja.

Temporão repete com freqüência que gosta de desafios. Despacha com Lula com bastante freqüência. O presidente está satisfeito com seu desempenho e o apoiou na polêmica do aborto ao dizer que como presidente é contrário a essa prática, mas disse que se trata de um caso de saúde pública.

O embate com o laboratório Merck, que culminou com a quebra da patente, foi uma vitória de Temporão. Uma disputa que pode gerar frutos. Após o episódio, pelo menos dois outros laboratórios internacionais que fabricam remédios anti-Aids avançaram na discussão sobre redução de preços com o governo. Ao falar sobre a proposta da Merck de um desconto de apenas 2% no Efavirenz, o ministro disse:

- Não gostaria nem de adjetivar o que é isso.