Título: Lula: greve sem desconto de dias parados é férias
Autor: Gois, Chico de e Damé, Luiza
Fonte: O Globo, 16/05/2007, O País, p. 8

A SEGUNDA VEZ: "Queremos regulamentar também o contrato coletivo de trabalho" no serviço público, disse ele.

Ex-sindicalista, presidente ataca paralisação no setor público e diz que ela prejudica o povo, e não o governo.

BRASÍLIA. Se depender do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a lei que vai regulamentar a greve no serviço público proibirá que os servidores recebam por dias parados. Na entrevista coletiva, Lula disse que isso é inaceitável, para ele e para o país, e que paralisações de 40, 60, 90 ou cem dias, com pagamento, não são greves, mas férias.

Com a experiência de ex-líder sindical, Lula disse que a greve na iniciativa privada, como as que ele liderava, tinha como objetivo provocar danos financeiros ao patrão para que este, acuado, pudesse ceder e atender algumas das reivindicações dos grevistas. No serviço público, de acordo com Lula, o prejudicado não é o governo, mas a população pobre, que é quem mais precisa dos serviços.

Lula disse desconhecer o motivo da greve dos funcionários do Ibama. Sobre biocombustível, afirmou que deve iniciar uma nova era de "humanização" do trabalho dos cortadores de cana.

Apesar de a cotação do dólar ter caído a menos de R$2 ontem, Lula afirmou que o governo continuará mantendo a livre flutuação da moeda norte-americana e lembrou que o dólar tem caído no mundo inteiro em relação a outras moedas. Para o presidente, a taxa de juros vai continuar caindo, mas ele não fará nenhuma bravata para isso.

GREVE DE SERVIDORES: "Meu comportamento com relação à greve não é um comportamento de presidente da República. A greve no setor público não deveria ser feita como se faz a greve numa fábrica. Quando nós fazemos uma greve numa fábrica, quando um trabalhador faz uma greve num comércio ou numa fábrica, o que ele está fazendo? Ele está tentando causar um prejuízo econômico ao patrão, para que o patrão possa ceder às suas reivindicações e, aí, ele voltar a trabalhar. No caso do servidor público não tem patrão, e o prejudicado, na verdade, não é o governo, é o povo brasileiro. Nós queremos, ao mesmo tempo em que discutimos esse assunto com eles, regulamentar também o contrato coletivo de trabalho para garantir ao servidor público que ele seja tratado democraticamente, como qualquer servidor é tratado em qualquer parte do mundo. O que não é possível, e nenhum brasileiro pode aceitar, é alguém fazer 40, 50, 90, 100 dias de greve e receber os dias parados, porque, aí, deixa de ser greve e passa a ser férias".

IBAMA/ENERGIA:"Por que o Ibama está em greve? Houve redução do salário do Ibama? Alguém foi mandado embora? Alguém foi trocado de função? Não. Apenas porque a ministra deu um sinal de que, depois de tantos anos de existência do Ibama, era preciso que houvesse uma modernização do Ibama. O que nós queremos na Santo Antônio e na Jirau? Veja, são duas hidrelétricas importantes para o país, são obras que vão custar acima de 9 bilhões de reais, são obras que vão gerar acima de 3 mil e 500 megawatts, cada uma delas, e são obras necessárias para o futuro deste país, a partir de 2012. O que eu não posso é deixar o governo em 2010 e o meu sucessor pegar um apagão. Se não der certo, quais são as alternativas que nós temos? Nós temos eólica, nós temos biomassa, nós temos termelétrica a carvão, a gás, a óleo diesel e a óleo combustível e temos energia nuclear. Nós não queremos fazer uma hidrelétrica depredando o meio ambiente. Só tem sentido fazer se a gente combinar a produção de energia com o cuidado ambiental neste país. (...) Quando tem divergência, essa divergência acaba quando chega à minha mesa. A Dilma e a Marina, a Dilma e o ministro dos Transportes, a Dilma e o ministro da Economia podem discutir o que quiserem. Vai ter um momento em que o assunto chegará à minha mesa. E, na minha mesa, há decisão e nós executamos aquilo."

DRU/ CPMF/GOVERNADORES: "Os governadores estão fazendo aquilo que é papel deles. Eles querem levar mais dinheiro para os seus estados, como os prefeitos querem levar mais dinheiro para os municípios, e isso não é nenhum problema. Todo mundo sabe, em sã consciência, que o Estado brasileiro não pode viver sem a CPMF e sem a DRU. Todo mundo sabe, porque se alguém tirar dinheiro da CPMF, nós vamos ter que tirar dinheiro do Orçamento. (...) E muitas vezes você esquece que você pode ser o governo e que a atitude pode lhe prejudicar no ano seguinte".

INTEGRAÇÃO DA AMÉRICA DO SUL: "Era normal que os países de menor poder econômico e de menor desenvolvimento vissem no Brasil uma espécie de imperialista, ou seja, tudo o que acontece de ruim é culpa do Brasil. (...) É importante lembrar que não foi decisão do Evo Morales. Antes do Evo tomar posse, um plebiscito na Bolívia, com mais de 90%, decidiu que o gás seria nacionalizado. (...) Eu acho que a riqueza mineral da Bolívia é da Bolívia, ele a vende para nós se quiser vender. Nós temos contrato. O que eu quero é que quando estabelecermos um contrato, esse contrato seja respeitado. E não é um problema com o Brasil."

TRABALHO ESCRAVO: "Agora que já consolidamos o álcool, no mundo, pelo menos conceitualmente como uma matriz energética de qualidade excepcional, é preciso que a gente dê o segundo passo para discutir a humanização do setor da cana neste país, estabelecer uma discussão com os empresários e com os trabalhadores para humanizar, para criar melhores condições de trabalho para que as pessoas possam ser profissionais e cidadãos na sua plenitude. Esse é o segundo passo que vamos dar. (...) Vamos abrir uma nova etapa de discussão para humanizar o mundo do trabalho no setor do álcool e do açúcar no Brasil."

CAOS AÉREO:"Não vamos confundir o acidente do avião da Gol com o Legacy como um problema dos aeroportos, até porque eles se chocaram no ar. (...) Tivemos um acidente, por conta desse acidente tivemos acusações de vários lados e, depois dessas acusações, o resultado foi que houve uma insatisfação nos setores de controladores, nos setores de manutenção, e nós começamos a ter problemas nos aeroportos brasileiros, ainda não ligados às pistas ou às obras brasileiras, mas ligados pura e simplesmente a um sistema de controle aéreo no Brasil. (...) Houve um conjunto de coisas que foram criando um problemão de magnitude quase incontrolável."

COPOM:"Eu não quero interferir no Copom porque acredito que, quanto mais autonomia tiver o Banco Central, melhor para o país, e eu acho que não precisa mandar uma lei (...) estabelecendo essa autonomia. Quero mostrar que é possível um presidente da República, responsável, não ter ingerência nas decisões do Banco Central, quando se trata de discutir assuntos da política monetária brasileira, para o bem ou para o mal".

JUROS: "Quando as pessoas viram oposição, elas colocam uma tapa nos olhos e se esquecem de quanto eram os juros quando elas governaram este país. (...) O juro vai chegar a um patamar que todo mundo sonha: juros compatíveis com os juros internacionais de países com quem o Brasil compete. Esse é o nosso desejo. Agora, sem fazer nenhuma estupidez, nenhum ato de bravata. Não vou fazer isso, porque, durante 27 anos da minha vida vivi recebendo salário e eu sei que quando a inflação aumentar, o prejudicado sou eu. E mais prejudicados ainda serão os trabalhadores que ganham o salário mínimo, os que recebem o Bolsa Família ou os que recebem auxílio-doença".

CHÁVEZ: "Chávez tem sido um parceiro inestimável do Brasil, sob todos os aspectos. O fato de alguém se posicionar contra o biocombustível é um problema de quem se posiciona contra. O Chávez é comprador de etanol do Brasil".