Título: 'O fígado é nosso'
Autor: Oliveira, Eliane e Novo, Aguinaldo
Fonte: O Globo, 16/05/2007, Economia, p. 24

SÃO PAULO. O diretor do Departamento de Economia da Fiesp diz que a valorização do real é um "pileque" em que muitos ganham - quem viaja, vive de renda ou compra importados - mas o "fígado" é o da indústria.

Qual o efeito desse câmbio para a indústria?

PAULO FRANCINI: Uma porcaria. Essa trajetória (de valorização do real) é uma condenação para a produção nacional. A indústria de transformação é um elemento fundamental para o crescimento saudável da economia, mas parece haver uma crença do governo no contrário.

Qual deveria ser a atitude do governo brasileiro frente ao dólar?

FRANCINI: Quando o governo fala que o câmbio é flutuante - na verdade, deveria dizer mergulhante -, ele se isenta de responsabilidades. Mas isso não é verdade. As autoridades assistiram com prazer à valorização do real, porque isso funcionou como um instrumento importante de combate à inflação. Parte dos agentes econômicos também aplaudiu. São aqueles que só importam, são os viajantes para Miami, são os rentistas. Todos têm ganho com esse pileque, mas o fígado é o da indústria de transformação.

A Fiesp tem previsão para a taxa futura de câmbio no país?

FRANCINI: É muito difícil (fazer uma previsão). Mas a tendência continua sendo de queda, porque o mercado acredita nisso. Qual o significado de uma informação como a de que os exportadores estão adiantando o fechamento de câmbio de seus contratos? Que as cotações vão continuar cedendo.

O presidente Lula afirma que a indústria reclama sem razão porque a economia vai bem. Como o senhor avalia isso?

FRANCINI: Você tem argumentos de todos os tipos. O Lula conta que só ouve notícias boas dos empresários com quem conversa. Eu digo que o país está cheio de gente que só quer agradar. Alguns afirmam que, se a indústria for mais produtiva, vai se adaptar a esse novo câmbio. É o mesmo que acreditar que meu cavalo vai aprender a não comer. O meu argumento é que um dia ele vai morrer de fome.