Título: Aspectos do corte
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 19/05/2007, O Globo, p. 2

Lançando estilhaços sobre diferentes grupos políticos, ligados ao governo ou à oposição, a Operação Navalha, da Polícia Federal, promete conseqüências políticas e administrativas. Atingiu frontalmente um grande esquema de corrupção em obras públicas que pode ter conexões na Comissão de Orçamento do Congresso. Um temporal pode estar apenas começando.

Por ter cortado de um lado e de outro, a ação da PF caiu no gosto popular. A PF está "lavando a alma brasileira", dizem os internautas em nosso blog. De alma lavada deve também estar, com razão, o ministro Tarso Genro: sobre ele foi lançada a suspeita, ao ser escolhido ministro da Justiça, de que poderia politizar as operações da PF. Vale dizer, orientá-las contra os adversários e a favor do governo.

O arrastão tocou num dos maiores focos de corrupção do país, de todos conhecido, o das obras públicas, que tem relação direta com o financiamento de campanhas. Os bancos cresceram como financiadores políticos mas as empreiteiras ainda são muito importantes no sistema. Por isso, muita lama ainda pode rolar, se a PF estiver mesmo disposta a afundar a navalha na carne.

Reações, entretanto, já estão se desenhando. O deputado Júlio Redecker (PSDB-RS), líder da minoria, já fazia ontem alguns questionamentos, que pretende ampliar em discurso na semana que vem.

- Uma operação como esta merece nosso apoio. Temos orgulho desta PF tão eficiente na identificação dos focos de corrupção. Mas há coisas estranhas, que precisam ser registradas. Navalha tem que cortar dos dois lados - diz ele. Redecker acha que a operação, tal como as outras duas (Hurricane e Têmis) puseram mais foco no Judiciário e Legislativo. Só bagrinhos do Executivo foram passados pela Navalha.

Aponta ainda como estranho o fato de o principal adversário do senador Sarney no Maranhão (José Reinaldo, ex-governador) ter sido preso. Mas o ministro Silas Rondeau, ligado ao senador, também teve um assessor preso.

Fica faltando também uma explicação para a diferença de tratamento aos investigados, diz ele. Ninguém foi preso no caso do valerioduto ou do dossiê anti-tucano, diz Redecker. Houve sim, mas foram todos soltos logo depois, como deve acontecer agora, por força de decisões judiciais. A PF, diz o líder, foi capaz de achar até os planos para fraudar licitações do PAC, mas não de investigar as obras suspeitas da Infraero. Nem as da Operação Tapa Buracos.

Tudo deve mesmo ser investigado, e agora a oposição pode ajudar, através das CPIs.

Por fim, haverá consequências administrativas. A descoberta dos planos para fraudar licitações de obras do PAC levarão a uma vigilância maior por parte da CGU e outros órgãos. A ministra Dilma quer ouvir as fitas da PF para identificar os projetos que despertaram a cobiça da quadrilha. É uma oportunidade de se pôr cadeado na porta antes do arrombamento.