Título: Obra teve recurso liberado antes de começar
Autor: Doca, Geralda e Talento, Biaggio
Fonte: O Globo, 19/05/2007, O País, p. 10

Recursos para serviço de urbanização na Bahia foram liberados por medida provisória, mas estão bloqueados.

BRASÍLIA e CAMAÇARI (BA). O Ministério das Cidades liberou dinheiro para um programa de urbanização de assentamentos em Camaçari, na Bahia, a ser executado pela Empreiteira Gautama, sem a obra ter começado. Dos R$9,75 milhões, foi liberado R$1,95 milhão, 20% do valor total do contrato, assinado em junho de 2006. Ontem, a Caixa Econômica Federal informou que esse dinheiro está bloqueado e que todos os projetos com a participação da Gautama foram suspensos para análise.

Segundo a subsecretária de Planejamento e Orçamento do Ministério das Cidades, Magda Cardoso, os recursos foram obtidos via crédito extraordinário, em medida provisória assinada pelo presidente Lula. Embora a orientação para repasses seja a de esperar pelo início da obra e fazer os desembolsos de acordo com o andamento do projeto, ela diz que, havendo dinheiro, pode haver liberação de recursos. Mas, nesse caso, a verba fica bloqueado na Caixa.

- Se a obra não sair, o tomador não recebe - disse.

Gautama: na licitação da transposição do São Francisco

A assessoria da Caixa afirmou que a verba ficou bloqueada na conta do tomador - a Prefeitura de Camaçari. Ou seja, a Gautama não conseguiu receber. Fontes ligadas às construtoras, no entanto, afirmam que várias obras concluídas estão à espera da liberação dos recursos.

A liberação da verba sem que a obra saísse do papel ocorreu em outros dois contratos com a construtora. Um deles é da área do Ministério do Turismo, para a construção de quatro pórticos em São Gonçalo (RJ) no valor de R$100 mil. O valor já foi liberado. O outro, da pasta do Esporte, trata da construção de um núcleo esportivo e de lazer, também em São Gonçalo, no valor de R$250 mil, também já liberados. Os dois contratos foram assinados em dezembro de 2005.

Segunda a CEF, a Gautama participa em nove projetos que estavam sob cuidados do superintendente de Repasses, Flávio José Pin, preso anteontem na Operação Navalha. As obras estão orçadas em R$32,4 milhões, sendo a de Camaçari um dos valores mais altos.

Em Camaçari, uma obra de drenagem e contenção de encosta no bairro Morro da Manteiga, na periferia, no valor de R$10 milhões (recursos do Ministério das Cidades), nunca realizada, teria sido um dos motivos que levaram o prefeito Luiz Caetano (PT) a ser preso. O processo que resultou na Operação Navalha corre em segredo de Justiça, mas, segundo uma fonte da cidade, a Gautama venceu também a concorrência pública número 15, realizada no início deste ano pela prefeitura, no valor de R$40 milhões, para obras de infra-estrutura na cidade.

A construtora também foi uma das empresas a apresentar proposta para concorrer às obras da transposição do Rio São Francisco, conduzida pelo Ministério da Integração Nacional. A licitação, ainda em curso, envolve recursos da ordem de R$3,3 bilhões.

População de Camaçari não entende prisão de prefeito

O coordenador do Projeto São Francisco, Rômulo de Macedo, acredita que as acusações contra a empresa não invalidarão o processo licitatório:

- Recebemos as propostas recentemente e ainda não abrimos os envelopes.

A mulher do prefeito de Camaçari e presidente da Câmara, Luiza Maia, afirmou ontem que, enquanto não for definida a situação do prefeito, "não haverá substituto". O prefeito foi preso sob acusação de beneficiar a Gautama num esquema de fraude de licitações de obras públicas. A primeira dama informa que a vice-prefeita, Tereza Difone, não vai assumir:

- Se preciso, ele vai despachar de dentro da cadeia.

Na cidade, a população parecia não entender por que o prefeito havia sido preso por uma licitação que não foi feita por sua gestão. Na praça, carros de som alugados pelo Partido dos Trabalhadores chamavam o povo para um ato público em defesa do prefeito, marcado para hoje de manhã. O alto-falante bradava pela honestidade do administrador do município. Um outro carro de som que rodava o Centro profetizava a volta do prefeito "aclamado pelo povo".

* da Agência A Tarde