Título: Relator é de igreja evangélica contra o aborto
Autor: Aggege, Soraya
Fonte: O Globo, 20/05/2007, O País, p. 9

Jorge Mudalen diz que convidará governo e entidades para debater.

BRASÍLIA. O deputado evangélico Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP), que preside a Comissão de Seguridade Social da Câmara, decidiu que será ele mesmo o relator do projeto de lei que descriminaliza o aborto no país e permite a interrupção voluntária da gravidez até a 12ª semana de gestação. A proposta tem o apoio da ministra Nilcéa Freire, da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. Mudalen foi pressionado por igrejas evangélicas para não escolher um parlamentar pró-aborto como relator.

O deputado Alceni Guerra (DEM-PR), ex-ministro da Saúde e vice-presidente da comissão, chegou a ser escolhido, mas foi destituído da relatoria por Mudalen, que é ligado à Igreja Internacional da Graça. Mudalen evitou dizer se é a favor ou contra o aborto, mas sua Igreja faz campanha contrária à legalização dessa prática.

- Não entendi. Ele apenas me disse que precisava ser o relator para atender a um pedido dos evangélicos - disse Alceni.

O projeto defendido pela ministra, apresentado à Câmara em 2005, tem como autores o Executivo e setores da sociedade civil. Nilcéa entregou a proposta pessoalmente à então deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), relatora à época. O projeto descriminaliza o aborto, assegura a realização desse procedimento no Sistema Único de Saúde (SUS), e obriga sua cobertura por planos privados de saúde.

Desarquivado no início de abril, o projeto é bombardeado pelos evangélicos na internet. O Comitê em Defesa Da Vida - Brasil Sem Aborto aconselhou as pessoas a enviarem mensagem eletrônicas a Mudalen para evitar que o relator fosse favorável à legalização do aborto. O grupo afirma que Jandira Feghali perdeu as eleições em 2006 para o Senado por "promover este este absurdo projeto". O texto ainda afirma: "Um relator a favor do aborto não representaria o pensamento do povo brasileiro, que é esmagadoramente contrário à legalização deste projeto".

Alceni disse ser contra a descriminalização do aborto. Para ele, os casos já previstos em lei - risco de saúde da gestante e gravidez decorrente de estupro - são os únicos aceitáveis.

- Sou pediatra e conheço bem o drama, a culpa na consciência de uma mulher que aborta - disse Alceni.

A deputada Cida Diogo (PT-RJ), integrante da Comissão de Seguridade e favorável à legalização do aborto, trabalhou para que outro parlamentar, Darcísio Perondi (PMDB-RS), fosse indicado relator do projeto. Perondi tem uma posição flexível sobre a interrupção da gravidez. Mudalen disse que vai convidar todos os setores - do governo a entidades da sociedade civil - para debater o projeto. Ele informou que o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, deverá ser um dos primeiros convidados.