Título: Economia põe polêmica em segundo plano
Autor:
Fonte: O Globo, 20/05/2007, O Mundo, p. 36

O Globo

BRASÍLIA, RECIFE e RIO. Quando, em julho de 2006, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, aderiu ao Mercosul, instalou-se um clima de alerta máximo em diversos setores da sociedade brasileira. Chávez é um personagem polêmico, que diversas vezes se confronta com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre, entre outros aspectos, a melhor forma de promover a integração dos países da América do Sul. Esse lado problemático de Chávez, porém, fica em segundo plano para o governo brasileiro e empresários que vendem, principalmente, manufaturas à Venezuela. Comércio e investimentos justificam o interesse pelo vizinho.

Os números mostram que o Brasil está diante de um mercado em expansão. Segundo o presidente da Câmara Brasil-Venezuela, José Francisco Marcondes, entre 2003 e 2006 os venezuelanos saltaram da 23ª para a 10ª posição entre os compradores de produtos brasileiros. Para 2010, espera-se que as vendas cheguem a US$8 bilhões.

- Só isso dá à Venezuela a importância estratégica na integração da América do Sul - enfatiza Marcondes.

Mas as autoridades brasileiras se incomodam com declarações de Chávez, como as críticas ao etanol. Também com a sombra do venezuelano sobre o presidente da Bolívia, Evo Morales, em momentos de tensão com o Brasil. Segundo fontes ligadas ao presidente Lula, a Venezuela abastece os bolivianos com dinheiro e coloca à sua disposição infra-estrutura caso a Petrobras decida sair do país.

- O Brasil tem que se afastar dessas fantasias chavistas. Nossos projetos nada têm a ver com os de Chávez - destaca o diplomata José Botafogo Gonçalves, ex-ministro de Indústria e Comércio no governo FHC.

Mas a cooperação econômica segue bem. A construção da refinaria Abreu Lima, em Pernambuco, é o primeiro grande projeto entre a Petrobras e a PDVSA a sair do papel. A refinaria terá 60% do seu capital da Petrobras e 40% da PDVSA. A unidade vem sendo erguida no município de Ipojuca, a 57 km de Recife, e terá capacidade para refinar 200 mil barris diários de petróleo, prevendo investimentos de US$2,5 bilhões e gerando US$970 milhões em impostos anuais.

O nome da refinaria - exigência de Chávez - é para homenagear um de seus ídolos, o general pernambucano Abreu Lima, autor do primeiro livro sobre a doutrina socialista no Brasil. Abreu Lima integrou as tropas de Simon Bolívar, o maior ídolo do presidente venezuelano. Chávez integrou habitantes da região à "Missão Milagre", seu projeto que leva pessoas carentes para serem operadas de catarata em Venezuela e Cuba. Além da refinaria em Pernambuco, as duas estatais desenvolvem estudos para projetos em parceria na área de exploração e produção de petróleo na Venezuela.

Mas Chávez também atua na cultura brasileira. Em 2006, graças ao patrocínio de R$1 milhão da PDVSA, a escola de samba Unidos de Vila Isabel foi campeã do carnaval carioca com o enredo "Soy loco por ti América: a Vila canta a latinidade". Em Caracas, a oposição não gostou do patrocínio. Em resposta, Chávez lamentou que alguns não entendessem que o investimento "é parte da luta ideológica".