Título: Recursos garantidos, projeto alterado
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 22/05/2007, O País, p. 5

Em Camaçari, Gautama elaborou plano de trabalho, atribuição da prefeitura.

BRASÍLIA. A empresa Gautama tinha tanta confiança de que seria beneficiada por obras da prefeitura de Camaçari (BA) que tratava com desleixo a elaboração do projeto. Relatório da Polícia Federal na Operação Navalha mostra que o projeto original previa a construção e reforma de mil unidades, mas a versão foi modificada, mais tarde, para a construção de apenas 150 casas.

As mudanças foram discutidas, segundo a PF, entre integrantes da Gautama, da prefeitura e da Caixa Econômica Federal. Relatório da PF conclui que, "após garantirem os recursos do Ministério das Cidades, o grupo passou a articular juntamente com servidores da prefeitura, incluindo o próprio prefeito, a elaboração do plano de trabalho e do projeto básico, cuja atribuição é da prefeitura, porém, conforme se verificou, foram confeccionados pela quadrilha".

De 9 a 16 de maio, a Polícia Federal flagrou uma maratona de reuniões e telefonemas para "montar" o plano de trabalho, já que o prazo final para a entrega da documentação na Caixa Econômica Federal (CEF) era o dia 16 de maio. De acordo com o relatório da PF, ao grupo "somente importava a confecção e apresentação de um plano de trabalho da prefeitura, não importando a qualidade desse, uma vez que a obra já estava garantida". Prova disso foi uma conversa entre Rodolpho Veras, filho de Zuleido Veras, e o engenheiro Jorge Barreto:

"Veja só, doutor, estou preenchendo quase que aleatoriamente, com o pouco conhecimento que eu tenho de áreas afins (...) Agora, um mínimo de informação eu realmente vou precisar", disse Jorge Barreto, engenheiro da Gautama, no dia 15 de maio.

As relações entre integrantes da Gautama e da prefeitura eram tão intensas que Rodolpho Veras disse que conseguira a assinatura do prefeito Luiz Caetano para o projeto antes mesmo de o plano de trabalho ter sido concluído. "Vou correr atrás da assinatura do prefeito, na última página (do contrato)", disse Rodolpho ao pai, Zuleido.

Verba ainda bloqueada porque obra não começou

Depois de entregue a documentação na Caixa, começaram as negociações para a mudança dos dados do projetos, como a troca de objetivo: de mil para 150 casas. Nas conversas, Rodolpho diz que inicialmente até a cidade apontada estava errada, Arembepe no lugar de Camaçari.

"A gente coloca o remanejamento das casas, mas não 800, mas vamos fazer menos. Até porque na localidade não tem nem 800 casas para a gente remanejar", disse Rodolpho a Flavio Candelot, com risos.

O contrato entre a prefeitura e o Ministério das Cidades, por meio da CEF, foi efetivamente assinado no dia 16 de junho de 2006, no valor global de R$11,5 milhões, sendo R$9.750.000 recursos do Ministério das Cidades e R$1.774.675,57 relativos à contrapartida municipal. Na prática, o governo repassou R$1,9 milhão, mas o dinheiro continua bloqueado na CEF já que a obra ainda não começou.