Título: O Instituto Chico Mendes
Autor: Neto, Paulo Nogueira
Fonte: O Globo, 24/05/2007, Opinião, p. 7

Na Federação brasileira a efetiva proteção da biodiversidade começou tarde, nos anos 30 do século passado, com a criação de alguns parques nacionais e com a aprovação de um Código Florestal bem intencionado mas muito pouco aplicado.

Contudo, após a Segunda Guerra Mundial, os problemas ambientais começaram a se agravar. Algumas décadas depois, os principais países resolveram convocar a Conferência de Estocolmo, em 1972, para tratar do assunto. A Federação muito pouco se preocupava com o meio ambiente, a ponto de um jornal de certo estado publicar um anúncio de meia página, com um desenho de uma chaminé soltando fumaça e os dizeres "Tragam para cá a sua poluição". Não quero entrar em detalhes, mas aos poucos a opinião pública foi mudando, principalmente em conseqüência de graves problemas de degradação atmosférica nas cidades de São Paulo, Cubatão, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Contagem e a poluição aquática em vários rios e pontos da costa. Louvo a clarividência de pessoas como Henrique Brandão Cavalcante, autor do decreto que em 1973 criou a Secretaria Especial do Meio Ambiente (Sema). Fui parte desse processo, como primeiro secretário da Sema, a qual inicialmente contava com 3 salas e 5 funcionários. Quero apenas dizer que sou um sobrevivente dessa época difícil.

A secretaria foi crescendo e ocupando vácuos de poder. Chegamos a estabelecer uma rede de 18 estações ecológicas, com 3.200.000 hectares, equivalente à área de 3 Repúblicas do Líbano. Houve também nessa época a criação, com a ajuda de vários estados, de alguns milhões de hectares de Áreas de Proteção Ambiental (APAs). Era o início de um esforço continuado para salvaguardar grandes espaços necessários à proteção da biodiversidade. Em certo ponto do processo de salvaguarda, foi criado o Ibama, mediante a fusão de Sema, IBDF e órgãos relacionados com a pesca e com a proteção a seringueiros. O Ibama nasceu com uma estrutura de miniministério. Mais adiante foi estabelecido o Ministério do Meio Ambiente, que de certo modo duplicou a estrutura do Ibama. Esse fato trouxe uma série de problemas que perduram até hoje, quando vemos uma parte do Ibama agir como se fosse o órgão máximo ambiental do país.

O resultado prático dessa história sui generis foi um conjunto de acertos mas também de dificuldades. O Ibama cresceu enormemente, passando a gerir cerca de 60 milhões de hectares de áreas protegidas, o que foi excelente no que se refere à sua extensão protetora. Contudo, permaneceram problemas de administração. O Ibama tornou-se um gigante problemático, apesar dos esforços e da integridade do seu presidente, professor Marcos Barros, e dos seus colaboradores. Além das dificuldades administrativas que prejudicavam as unidades de conservação, surgiram outras.

Diante desse quadro, que preocupava as ONGs ambientalistas e também a área central do Ministério do Meio Ambiente, a ministra Marina Silva, com a colaboração do secretário de Biodiversidade e Florestas, João Paulo Ribeiro Capobianco, e com o apoio de muitas ONGs e personalidades, com a devida autorização do presidente da República, optou por uma solução radical mas necessária e inadiável. Foi finalmente dividido o Ibama.

O Ibama poderá dedicar-se mais a estudos ambientais, aos licenciamentos e à tomada de medidas necessárias ao desenvolvimento sustentável do país. Poderá expandir suas atividades nos campos do controle do aquecimento climático, do controle federal da poluição nos rios federais e no oceano e em muitos outros setores. Haverá, assim, um aperfeiçoamento efetivo do Ibama, com a concentração de suas atividades.

Por outro lado, o novo Instituto Chico Mendes cuidará melhor das unidades de conservação, superando uma série de entraves e dificuldades burocráticas. Poderá receber e dirigir muito melhor e mais de perto a ajuda externa e interna que lhe for destinada, como é o caso das compensações ambientais federais. Somente isso já justificaria, de sobra, e criação do Instituto Chico Mendes. Poderá ter a sua responsabilidade reforçada com um corpo de consultores provenientes de universidades e de ONGs brasileiras. Terá, em resumo, a possibilidade de resolver questões fundamentais de biodiversidade, sem desviar suas atenções para outros assuntos.

Quando a ministra Marina Silva, em boa hora, anunciou durante uma reunião do Conselho Nacional do Meio ambiente (Conama) a criação do Instituto Chico Mendes de Proteção à Biodiversidade, gritei de onde estava um sonoro VIVA!

Nada de melhor para o meio ambiente poderia ter acontecido nestes tempos, em matéria de novos rumos ambientais a seguir, que essa decisão de criar essa nova instituição para proteger a biodiversidade.

VIVA! Mil vezes VIVA!

PAULO NOGUEIRA-NETO é presidente honorário do WWF-Brasil e membro do Conama.

N. da R.: Verissimo está de férias.