Título: 'Isto é que é jogar dinheiro no ralo', afirma um líder
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Fonte: O Globo, 25/05/2007, O País, p. 3

Casas rachadas ou inacabadas e esgoto espalhado pelas ruas são trabalho entregue pela Gautama no Parque Vila Nova, em Caxias.

Os cerca de R$13 milhões que teriam sido gastos na construção de 568 casas populares e em obras de saneamento no Parque Vila Nova, antiga Favela do Lixão, em Duque de Caxias, foram literalmente para o esgoto. Cerca de sete anos após o início das obras - orçadas em R$41,8 milhões, iniciadas pela empreiteira Gautama e herdadas pela Construtora LJA Ltda, de Latif Abud, ex-sócio de Zuleido Veras -, o que se vê na comunidade são ruas de piso rachado, afundadas em água suja e detritos, casas com rachaduras e moradias inacabadas, algumas só na fundação. Reportagem do GLOBO de anteontem mostrou que, dois dias antes de o então governador Anthony Garotinho deixar o cargo, em abril de 2002, liberou recursos em regime de prioridade para a Gautama fazer a obra.

- Toda a obra de esgoto foi malfeita, já nasceu entupida. Em vez de usarem tubos de 500 milímetros, em concreto, usaram canos de plástico de uns 150 milímetros. Os canos não agüentam a pressão e estouram, espalhando esgoto - diz o agente comunitário Luiz Cláudio Corrêa. - Isto é que é jogar dinheiro no ralo.

Carmem Lourdes da Silva, de 39 anos, mora com o marido e quatro filhos na beira do rio fétido de esgoto que se formou na Rua São José, há cerca de um ano.

- Quando chove, a sujeira transborda e invade a minha casa - conta ela.

Na Rua República, José Carlos Barbosa da Silva usa galochas para escoar, com uma vassoura, o esgoto que ameaça entrar na sua casa:

- Está tudo entupido aqui. A rua é mais alta que nossas casas.

O esgoto, diz o ex-secretário de Habitação de Caxias Aroldo Brito, deveria ser despejado numa área entre a favela e a Linha Vermelha apelidada na região de "Pinicão do Garotinho".

- Olha que projeto de engenharia maravilhoso! - ironiza Aroldo, apontando para o grande lago formado por água da chuva e esgoto.

Ali perto estão conjuntos de casas inacabadas, algumas na fundação. Muitas das prontas apresentam enormes rachaduras.

De acordo com moradores, os operários das empreiteiras desapareceram há um ano. Ficaram placas, como a que anuncia a obra da LJA. Há 20 dias, contam eles, surgiu uma nova placa, do governo federal, anunciando um programa de "implantação e modernização da infra-estrutura para esporte recreativo e lazer". Nela se lê que os investimentos serão da ordem de R$600 mil e que 25 mil famílias serão beneficiadas.

- Mas aqui só tem 12 mil famílias - corrige Luiz Cláudio, já sem crer em melhorias.

O ex-secretário disse que o convênio que garantia à prefeitura a gerência do contrato com a Gautama, em 1998, foi cancelado assim que Garotinho assumiu o governo, em 1999. Segundo Brito, a medida foi tomada para impedir que o município pudesse acompanhar a execução das obras. A empresa recebeu 14 pagamentos em regime de prioridade dois dias antes de Garotinho deixar o cargo, em abril de 2002.

O então presidente da Companhia estadual de Habitação (Cehab), Aluísio Meyer, rebateu a acusação. Disse que o convênio foi cancelado porque Caxias não cumpria a contrapartida do contrato, o que estaria atrasando o início das obras. O contrato, assinado ainda no governo Marcello Alencar, mas que recebeu cinco aditivos no governo Garotinho, está sendo analisando pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE).

O atual secretário estadual de Habitação, Noel de Carvalho, informou que o governo está fazendo auditoria nos contratos da Cehab. As obras em Caxias estão paralisadas aguardando inspeção do TCE e auditoria da Cehab. Ainda falta a construção de seis unidades.