Título: Lobby x corrupção
Autor: Thomé, Debora
Fonte: O Globo, 26/05/2007, Economia, p. 34

Quando um grupo de grávidas vai ao Congresso para pedir mais tempo de licença-maternidade, elas estão fazendo lobby. Quando uma empresa quer permitir que um produto novo seja autorizado e, para isso, vai até aos parlamentares, ela também está fazendo lobby. Ambas as atitudes são lícitas e até bem-vindas na democracia. Porém, se, para tanto, é feito um pagamento ao parlamentar ou a qualquer pessoa do governo, o nome é corrupção. O problema aumenta quando se confundem as duas coisas.

A tentativa foi grande de fugir do tema, de ficar presa à economia, mas, muitas vezes, é difícil dissociar a economia da política, afinal os custos de uma incidem na outra; e vice-versa. Ontem, numa edição antecipada, a "Veja" trouxe mais um caso de corrupção numa semana cheia deles, com queda até de ministro. Desta vez, a revista comentava a atuação de um "lobista" de empreiteira que pagaria apartamento, pensão de filha e tudo mais para o presidente do Senado.

Lobista no Brasil é palavrão. Mas todas essas associações de diferentes setores que citamos todos os dias nas reportagens são lobistas, e não há qualquer problema nisso, afinal, na democracia, é esperado que os grupos se organizem para defender interesses junto a seus representantes.

- O lobista é uma pessoa que faz o canal entre o poder público e o setor privado, que defende, sim, interesses de seus clientes, mas o faz dando informações fidedignas, deixando claro o impacto do que está sendo defendido para a sociedade. Quem paga para parlamentar ou para qualquer executivo não está fazendo lobby; é corrupção mesmo - explica Anna Paula Losi, que, junto com outros lobistas, está organizando a Associação Brasileira de Profissionais de Relações Institucionais e Governamentais, que pretende dar alguns parâmetros ao setor.

Todas as vezes em que aparecem muitos casos de corrupção, como tem sido agora, o tema da regulamentação do lobista volta à baila. O que há hoje é apenas um projeto de lei antigo do senador Marco Maciel que tenta estabelecer regras semelhantes às dos Estados Unidos. Lá, a primeira legislação sobre lobby é de 1946. A atual, é de 1995.

- Nos EUA, o lobista, para atuar, é obrigado a se registrar e informar o que está fazendo, quais são os interesses que defende. Pagar ao parlamentar, claro, é ilegal - comenta o professor Wagner Pralon Mancuso, do curso de Gestão de Políticas Públicas da USP, doutor no assunto.

O professor tem dúvidas se uma lei que regulamentasse o lobby poderia inibir a corrupção, isso porque, para ele, como a natureza dessa relação é existir escondida, ela só aparece quando há investigações. Anna Paula Losi, acha que ajudaria, mas não resolveria. O professor Ricardo Caldas, coordenador de graduação de Ciência Política da UnB, defende a regulamentação:

- Há grupos corretíssimos que fazem o lobby institucional, é totalmente diferente de tráfico de influência ou corrupção.

É a velha história: quando um não quer, dois não brigam. O problema é que é sempre difícil identificar se surgiram primeiro os políticos corruptos ou seus corruptores que, talvez um dia, tenham, sim, tentado ser apenas lobistas.

A verdade é que os parlamentares mal-intencionados - com perdão pelo eufemismo - acabam se beneficiando do fato de não haver qualquer controle sobre a atividade do lobby. Caso fosse regulamentada, poderíamos ter, qualquer um de nós, o direito de saber quanto cada empresa, ou setor, ou sindicato, estava gastando em estudos ou contratação de serviços defendendo seus interesses - e quais são eles. A transparência não resolve. Mas pode ajudar a constranger alguns políticos tão desinibidos destes tempos.