Título: Paraguai exporta 'made in China'
Autor: Scofield Jr., Gilberto
Fonte: O Globo, 28/05/2007, Economia, p. 15

Produtos chineses inundam país vizinho, que os envia para o Brasil, como contrabando.

Pela primeira vez na História, a China ultrapassou o Brasil como principal fornecedor externo do Paraguai. Enquanto o Brasil exportou para os paraguaios, em 2006, US$1,23 bilhão, de acordo com o Ministério do Desenvolvimento, a China exportou para aquele país US$1,41 bilhão, segundo dados do Banco Central do Paraguai (BCP), aos quais a Embaixada do Brasil em Assunção teve acesso. Os componentes de informática representaram cerca de metade desse total. O problema é que o mercado paraguaio não tem tamanho para absorver tudo isso. Para se ter uma idéia, o Brasil importou da China cerca de US$70 milhões em placas-mãe em 2006 - contra US$153 milhões importados pelo Paraguai. Segundo analistas, o Paraguai está reexportando esses produtos para países da região - em especial o Brasil -, principalmente sob a forma de contrabando.

O governo brasileiro confirma que a inundação de produtos chineses de informática no minúsculo Paraguai acaba virando contrabando para o Brasil e a Argentina, segundo autoridades do Ministério do Desenvolvimento e da Receita ouvidas pelo GLOBO. O Fisco afirma que, do total de mercadorias contrabandeadas do Paraguai para o Brasil, de 25% a 30% são insumos, componentes e produtos eletroeletrônicos e de informática.

- Parte desses produtos vem para o Brasil e outra quantidade considerável vai para a Argentina - disse o chefe da Divisão Nacional de Repressão ao Contrabando e à Pirataria da Receita, Mauro de Brito.

Ele não soube dimensionar o volume reexportado pelo Paraguai para o Brasil. Mas disse que a tese é reforçada pelo número de habitantes de cada país: quase 200 milhões no Brasil, cerca de 40 milhões na Argentina e apenas 5 milhões no Paraguai.

Queda de impostos reduziu ilegalidade

O BCP reconhece o problema da reexportação de produtos chineses via Paraguai de forma ilegal e confirma os números apurados pelo GLOBO sobre as importações de 2006. Segundo um dos diretores da instituição, não é possível saber para que países os produtos são reexportados, mas ele admite que boa parte vem para o Brasil. Mesmo porque, reforça, o potencial de consumo é bem menor que as importações.

Os dados são compilados pelo BC paraguaio com base num levantamento em áreas aduaneiras e não divulgados oficialmente, já que o país não mantém relações diplomáticas com a China, mas com Taiwan. Ano passado, segundo o BCP, Taiwan exportou para o Paraguai US$64,6 milhões e importou US$5,1 milhões. A China não aparece na lista oficial dos 31 maiores parceiros do país.

Dados do BCP mostram que, no primeiro trimestre deste ano, as importações da China somaram US$380,1 milhões, contra US$271,4 milhões no mesmo período de 2006 (alta de 40%). Entre os itens, máquinas e aparelhos mecânicos e eletroeletrônicos, que registraram aumento de 35,6% e 48,3%, respectivamente. A maior alta foi de brinquedos: 122%.

A origem da emergência da China no comércio exterior paraguaio está na decisão do governo Nicanor Duarte de incluir componentes de informática, como placas-mãe e memória, entre outros, na lista de exceções à Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul. Isso zerou a alíquota de 30% que incidia sobre os produtos. A medida foi tomada no início de 2006 para alavancar o comércio em Ciudad del Este, afetado, desde 2003, pela ação mais firme da Polícia Federal e da Receita contra sacoleiros na Tríplice Fronteira (Brasil, Argentina e Paraguai).

- Ano passado, o comércio exterior do Paraguai fechou com o maior déficit dos últimos anos: US$3,3 bilhões - diz Breno Costa, chefe do Setor Econômico da Embaixada do Brasil em Assunção. - O país importou US$5,2 bilhões e exportou US$1,9 bilhões. Se o Paraguai não fizesse o que o BCP chama de reexportação não-declarada, a desvalorização do guarani (moeda local) seria gigante.

Mas, segundo ele, o guarani se valorizou 17% frente ao dólar este ano.

- O que significa que o contrabando é alto - afirmou.

Mas o Paraguai reclama que a redução de impostos feita pelo Brasil, via Lei de Informática e MP do Bem, reduziu a participação de suas vendas para o mercado de Tecnologia da Informação (TI) brasileiro, cujo faturamento estaria hoje em torno de US$7 bilhões. Essa fatia, segundo documento enviado ao governo brasileiro, seria de 15%, quando já foi de 75%. Brito, da Receita, concorda que os benefícios fiscais concedidos ao setor ajudaram a reduzir o contrabando, cujo maior atrativo é oferecer produtos até 40% mais baratos:

- A coisa era tão grave que a estimativa de abrangência do mercado cinza era de cerca de 70%. Hoje, as empresas que trabalham na legalidade comemoram uma redução, apesar de uma estimativa ainda em 50%.

O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Eletroeletrônicos (Abinee), Humberto Barbato, acredita que o mercado brasileiro fechará 2007 com 70% na legalidade:

- Os importadores levaram um golpe com os incentivos.

(*) Correspondente