Título: Não tenho como ter provas
Autor: Gois, Chico de e Franco, Ilimar
Fonte: O Globo, 30/05/2007, O País, p. 3

MAIS UM ESCÂNDALO

Renan admite não poder comprovar repasses; aliados, porém, decidem "blindá-lo".

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), admitiu ontem que não tem como provar, com documentos, que saíram de suas contas todos os repasses feitos à jornalista Mônica Veloso, antes de dezembro de 2005, quando reconheceu a paternidade da filha que teve com ela. A falta de recibos se refere a pagamentos feitos pelo lobista Cláudio Gontijo, da empreiteira Mendes Júnior. Isso dificulta a defesa de Renan, já que há dúvidas sobre a origem desses recursos: se são do senador ou do lobista. O senador deu essa declaração no Ministério de Relações Exteriores, depois de ter participado de um almoço com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em homenagem ao secretário-geral do Partido Comunista do Vietnã, Nong Duc Manh.

- Não tenho como ter provas das transferências porque não eram oficiais. A partir do momento em que assumi (a paternidade), tenho os comprovantes - disse Renan. Seus aliados no Senado, porém, já fizeram um acordão para tentar evitar a investigação contra ele.

O senador se referiu ao período entre 2004, durante a gestação da filha, até dezembro de 2005, quando reconheceu a paternidade. Nesse período, segundo Renan, eram feitos pagamentos mensais de R$8 mil, além do pagamento de um aluguel de R$4,5 mil e depois de R$4 mil. A assessoria do senador afirmou que, nesse intervalo de 23 meses, foram feitos pagamentos por transferência bancária e outros em dinheiro vivo, entregues a Mônica por Gontijo, amigo de Renan. O senador acrescentou que a falta de comprovantes é dos pagamentos feitos a Mônica, não da origem dos recursos.

Ele deixou claro que não pretende apresentar novos documentos para comprovar sua versão. Pelo menos por enquanto. Alguns interlocutores de Renan admitiam ontem, em conservas reservadas, que ele estaria escondendo cartas na manga, caso necessite se defender de novas denúncias.

- Falei ao Senado. Falei ao país. Entreguei absolutamente tudo, não está faltando nada - desconversou Renan.

Um aliado de Renan disse que, nesse período, a família do senador desconhecia a existência de sua vida extraconjugal. Segundo esse parlamentar, a falta de comprovantes se refere aos pagamentos em espécie. As transferências bancárias estão documentadas, mas não foram tornadas públicas porque há dúvidas se o gesto não implicaria a quebra do sigilo bancário da jornalista.

ACM: "Aqui ninguém tira o presidente do Senado"

Apesar das explicações incompletas sobre a origem dos recursos dadas por Renan, a maioria dos senadores não vê motivos para que ele se afaste do cargo. Ele conseguiu um crédito de confiança tanto dos governistas quanto dos oposicionistas. Os principais líderes do Senado disseram achar que, sem o surgimento de fatos novos, não há motivos para seu afastamento.

- Aqui no plenário ninguém tira o presidente do Senado - resumiu o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA).

Um dia após passar pelo constrangimento de falar de sua vida pessoal no plenário do Senado, Renan tentou voltar à normalidade. Compareceu a uma recepção, no Ministério de Relações Exteriores, e presidiu a sessão do Senado, à tarde.

Antes de ir ao Itamaraty, Renan se reuniu no gabinete da presidência do Senado com um grupo de senadores, incluindo Antonio Carlos Magalhães, Aloizio Mercadante (PT-SP), Edison Lobão (DEM-MA) e o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), com quem fez uma avaliação política do discurso. Nessa conversa, a cobertura da imprensa sobre o caso foi duramente criticada.

Renan disse que seu advogado, Eduardo Ferrão, está preparando os documentos que faltavam para completar a sua defesa, sobretudo no que se refere aos pagamentos, de R$8 mil mensais e mais um aluguel, feitos antes de dezembro de 2005.

- Há uma solidariedade muito grande na Casa, principalmente pelo fato de ele ter sido alvo de uma acusação sem provas - disse Virgílio.

Para se defender de um possível processo disciplinar no Conselho de Ética, Renan enviou ontem para o corregedor do Senado, Romeu Tuma (DEM-SP), documentos que tentam comprovar que os pagamentos feitos a Mônica foram com recursos próprios. Entre eles estão as declarações de Imposto de Renda completas, onde há registro de que em 2005 o senador obteve rendimentos agropecuários no valor de R$201 mil e, em 2006, de R$435 mil.

Essas declarações não constam dos documentos divulgados anteontem. Para Mercadante, esses dados, e a inexistência de prova testemunhal e documental, fizeram com que a maioria da Casa ficasse ao lado de Renan.