Título: Inimiga do Estado
Autor:
Fonte: O Globo, 30/05/2007, O Mundo, p. 28

Chávez volta baterias contra última emissora de TV opositora, denuncia complô e ameaça mídia.

CARACAS

Enquanto milhares de estudantes ocupavam as ruas da capital e de outras cidades venezuelanas contra o fim da concessão da emissora Radio Caracas Televisión (RCTV), o presidente Hugo Chávez fez ontem um duro pronunciamento. Ele chamou a Globovisión, último canal de TV crítico ao governo, de inimiga do Estado, sugerindo que pode cassar sua concessão, acusou a oposição e meios de comunicação de promoverem a desestabilização do país e disse que está disposto a fazer o necessário para deter a violência.

Em cadeia nacional, Chávez advertiu a Globovisión e outros meios de comunicação, que chamou de "apátridas", de que "se continuarem a conclamar a desobediência", deverão assumir "as conseqüências". Ele disse aos venezuelanos para estarem alerta caso as manifestações se transformem num golpe contra o governo, pedindo que as áreas pobres repitam o apoio demonstrado durante a tentativa de golpe de 13 de abril de 2002.

- Estejam alerta nos morros, nas favelas. O povo, alerta! - disse Chávez. - Se tivermos que lançar um outro 13 de abril, eu o comandarei.

Diante das manifestações de milhares de universitários - no que muitos já consideram os maiores protestos estudantis desde que Chávez assumiu o poder, há nove anos - o presidente lamentou que alunos "sejam manipulados" pela oposição, que segundo ele pretende "incendiar as ruas".

- Faço um chamado a mães e pais desses estudantes que estão sendo manipulados. Quem os está usando quer (causar) alguns mortos - disse Chávez.

Alunos entregam carta à OEA

O presidente acusou a Globovisión de incitar seu assassinato e recomendou que a direção da emissora se contenha. Na véspera, o governo denunciou à Procuradoria Geral o canal por esse motivo e a americana CNN por manipular informação:

- Inimigos da pátria, particularmente aqueles nos bastidores, eu lhes dou um nome: Globovisión. Vocês deveriam ver para onde estão indo. Recomendo tomarem um tranqüilizante e reduzirem a velocidade. Se não, vou fazer o que for necessário.

O diretor da Globovisión, Alberto Ravell, chamou as acusações de ridículas, mas se mostrou preocupado com a nova ofensiva do governo. Além disso, 156 emissoras de rádio AM que solicitaram a renovação da concessão estão preocupadas, porque ainda não obtiveram resposta.

- Se o governo fechou a estação de TV mais antiga do país, com 53 anos, como não vai fechar esta que é muito menor? - disse Ravell.

Aumentando a tensão, o vice-presidente da Assembléia Nacional, Roberto Hernández, acusou setores da oposição de utilizarem o caso da RCTV para promover um golpe de Estado.

- Estão criando focos de violência com o propósito de obter mortos, feridos e passar a imagem de que a Venezuela é ingovernável - disse.

O movimento estudantil, que esteve ausente da conturbada cena política nos últimos 20 anos, voltou ontem às ruas pelo segundo dia consecutivo. As passeatas reuniram dezenas de milhares de pessoas e tiveram novamente como ponto de concentração a Praça Brión. Também houve manifestações em San Cristóbal, Mérida, Barcelona e Maracay. Um grupo de estudantes foi ao escritório da Organização dos Estados Americanos para entregar uma carta contra o fim da TV.