Título: Em Campinas, informações sobre aborto ilegal
Autor: Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 31/05/2007, O País, p. 13

Projeto, que explicará técnicas abortivas a gestantes, tem como objetivo reduzir a taxa de mortalidade materna

Demétrio Weber

BRASÍLIA. Mulheres grávidas que quiserem fazer aborto ilegal receberão informações sobre técnicas abortivas e suas conseqüências em postos de saúde da prefeitura de Campinas, no interior de São Paulo. O projeto funcionará em 15 unidades, a partir de agosto, disse ontem o diretor da ONG Bem-Estar Familiar no Brasil (Bemfam), Ney Costa. A Bemfam e a Unicamp participam da iniciativa.

Costa negou que o projeto pretenda praticar qualquer ilegalidade ou fazer a apologia do aborto. O argumento é que a população tem direito à informação e que o serviço será meramente educativo, dando orientação médica às mulheres.

- É apologia a salvar vidas. O cunho não é de incentivar (o aborto). É o princípio da escolha informada. A intervenção é em nível de educação - diz Costa, que participou ontem do lançamento da versão em português do relatório "Morte e Negação: Abortamento Inseguro e Pobreza", da Federação Internacional de Planejamento Familiar ((IPPF, na sigla em inglês).

O objetivo é levar as mulheres a, inicialmente, fazer teste de gravidez. As que desejarem continuar a gestação serão encaminhadas ao pré-natal. As demais passarão por "pré-aconselhamento", em que receberão informações sobre métodos abortivos, entre os quais o remédio à base de misoprostol, substância usada para tratamento de úlcera e que provoca contrações do útero até a eliminação do feto.

Hospital do Uruguai reduz casos de morte materna

A iniciativa copia a experiência de hospital do Uruguai. O espírito é o mesmo de programas de redução de danos entre usuários de drogas injetáveis, quando o serviço de saúde fornece seringas, para evitar a contaminação pelo vírus HIV.

Costa disse que as mulheres de classe média e alta têm acesso a médicos e clínicas particulares, enquanto a população pobre não recebe assistência. O pressuposto é que as mulheres que querem abortar assim o farão, mesmo em condições inseguras, perfurando o útero com agulhas de tricô ou injetando substâncias ácidas.

O professor da Unicamp e coordenador do Grupo de Trabalho sobre Aborto Inseguro da Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia, Aníbal Faúndes, disse que o hospital uruguaio Pereyra Rossel reduziu para quase zero os casos de mortalidade materna em Montevidéu após a implantação do programa, em 2004. Segundo ele, 48% das mortes maternas no hospital eram causadas por abortos ilegais ou inseguros.

Os remédios a base de misoprostol só poderão ser obtidos em hospitais autorizados. No entanto, é intenso o comércio ilegal, inclusive na internet.

A IPPF estima que 19 milhões de abortos clandestinos sejam realizados por ano, no mundo, provocando a morte de 70 mil mulheres, além de deixar seqüelas em milhares. No Brasil, os abortos ilegais são responsáveis pela morte de 180 a 360 mulheres por ano, segundo a ex-coordenadora de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde Maria José Araújo. O relatório, que teve sua versão em inglês, divulgada em setembro de 2006, nos Estados Unidos, informa que 46 milhões de abortos intencionais são realizados mundialmente a cada ano, dos quais 78% em países em desenvolvimento e 22% em países desenvolvidos.

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