Título: Planejamento familiar hoje chega tarde para jovens
Autor: Menzes, Maiá
Fonte: O Globo, 03/06/2007, O País, p. 17

Incremento do programa pelo governo federal esbarra ainda na desinformação e na falta de educação sexual

Eliana Lopes Damião ficou grávida pela primeira vez aos 14 anos - de Karolina, hoje com 6. De lá para cá, não parou: chegaram Karina, de 5; Kamily, de 3; Kaiquy, de 2; e Kailany, de 10 meses. Nenhum deles foi planejado por Eliana, hoje com 22 anos, moradora do morro do Sereno, na Penha, Zona Norte do Rio. Faltou informação, diz a dona-de-casa, que descobriu, por uma amiga, a possibilidade de acesso gratuito a anticoncepcionais e à camisinha. Já estava grávida do quarto filho. Participou, então, de reuniões num posto de saúde municipal, interessada em fazer laqueadura de trompas.

- A única filha que eu quis foi a mais velha, mas não tinha idéia de como me proteger. Os outros foram inesperados. Eu dizia que ia tirar, mas nunca tive coragem. Sei que é um direito meu fazer a laqueadura, mas todos dizem que sou muito nova - conta Eliana, que já tentou fazer a cirurgia no centro social de um candidato a deputado, sem sucesso, e hoje toma uma injeção hormonal a cada três meses, a um custo de R$16, paga pelos pais.

O caso de Eliana ilustra um nítido contraste: enquanto o governo federal incrementa a distribuição e o acesso a métodos contraceptivos, o jovem carente ainda enfrenta os efeitos da desinformação. Que levam a um acesso tardio ao planejamento familiar gratuito.

- A informação não existe de forma suficiente para os segmentos mais populares. E cabe ao Estado fazer a intensificação da informação. No entanto, ela tem que ser associada ao debate. Precisamos que a família e a escola cumpram o seu papel. É preciso haver assimilação da informação, para ser transformada em prática - diz Ádson França, coordenador do Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade Materna e Neonatal, do Ministério da Saúde.

Escolas de 451 municípios falam de planejamento

O governo, no ano passado, iniciou o programa Saúde e Prevenção nas Escolas, uma parceria entre os ministérios da Saúde e da Educação. Até agora, 451 prefeituras aderiram. Para a pesquisadora da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids, Sônia Corrêa, o esforço ainda é insuficiente:

- Está claro que o sistema de saúde não é o adequado para o adolescente aprender sobre reprodução. O jovem com menos recurso é o que tem menos acesso à informação. Isso requer uma pequena revolução - afirma Sônia, que alerta para o risco de apenas popularizar o acesso às pílulas anticoncepcionais:

- É legal baixar o preço e facilitar o acesso. Mas o fato de ter acesso ao método na farmácia não assegura que a pessoa vá usar de maneira adequada. Além disso, é preciso fazer campanha pela dupla proteção. Porque a Aids é uma realidade para as mulheres - afirma a pesquisadora, numa referência ao anúncio, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na semana passada, da redução do preço de anticoncepcionais para R$0,40 em 3.500 farmácias credenciadas.

Orientação chega para as grávidas, diz secretaria

A gerente da saúde da mulher da Secretaria Municipal de Saúde do Rio, Diana Cristina e Silva, atesta a necessidade de orientação ao jovem. Hoje, o planejamento familiar acaba acessível apenas às gestantes ou às mulheres que já tiveram filhos - serviço oferecido em 130 unidades de saúde do município.

- A orientação sobre a gravidez precoce depende de um trabalho integrado entre as secretarias de educação, esporte e lazer, serviço social e saúde. Muitas vezes a adolescente chega ao posto de saúde já como gestante - diz Diana.