Título: Regras de passagem
Autor: Cruvinel, Tereza
Fonte: O Globo, 05/06/2007, O Globo, p. 2

Aprovando ou não o voto em lista partidária fechada, a reforma política tem que servir a alguma mudança no sistema de financiamento de campanhas eleitorais. Está claro, claríssimo, que urge reduzir a promiscuidade entre o poder econômico e a vida política, facilitada pelo financiamento privado. Mas, chegada a hora, estão surgindo novos pretextos para o imobilismo.

E o maior deles é sempre relacionado com a passagem brusca de um sistema para o outro. Contra essas desculpas e dificuldades, o deputado Flávio Dino apresentou projeto de transição bastante razoável e criativo, de modo que em 2014 tenhamos o financiamento exclusivamente público.

Começa ele pela imposição de um limite ao gasto eleitoral, que seria calculado e fixado com base na média do gasto da eleição anterior (a de 2004 para prefeito e vereador, a de 2006 para os demais cargos). Temos visto os gastos eleitorais dispararem a cada pleito, indiferentes à inflação baixa. Fixado o limite, o TSE só faria a correção monetária periódica.

Na transição, pessoas jurídicas poderiam doar no máximo R$500 mil, e as pessoas físicas, até R$50 mil. A outra novidade é que o doador privado teria garantida a devolução de 30% de sua doação (por um fundo eleitoral gerido pelo TSE), valendo a regra também para os gastos do candidato com dinheiro próprio. Acha o deputado Dino que isso estimula a doação legal, em desfavor do caixa dois. Diz ele:

- Os doadores, sabendo que terão parte do dinheiro de volta, insistirão no recibo para garantir o resgate. Cada doação a candidato implicaria também doação de mesmo valor ao fundo partidário, sem compromisso de devolução. Isso inibiria as relações personalistas e o individualismo dos candidatos, fortalecendo a instituição partidária. Por fim, propaganda em muros e fachadas, bem como a distribuição de bonés, camisetas e outros brindes, continuariam proibidos. São propostas para uma travessia que muitos acham difícil. O desafio dos congressistas agora é exatamente o de contornar obstáculos para chegarem à reforma possível. Mas, para isso, precisam querê-la.

O ex-deputado Vivaldo Barbosa estranha que os partidos, até agora, não tenham deflagrado uma discussão com suas bancadas sobre os pontos da reforma em pauta. Está cobrando de seu partido, o PDT. "Se é tão evidente que nosso sistema eleitoral só traz malefícios, por que insistir em preservá-lo?", pergunta Vivaldo. Parece mistério, mas não é. O sistema é ruim, mas com ele os que estão na política já aprenderam a se dar bem.