Título: Todo o gás para a agricultura
Autor: Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 06/06/2007, Economia, p. 31

A CORRIDA DA ENERGIA

Aumento do uso de biocombustíveis no mundo impulsiona exportações de grãos brasileiros.

Oaumento mundial do uso de biocombustíveis começa a afetar fortemente a agricultura brasileira - e para o bem. O fenômeno não é apenas sentido na exportação de álcool, que cresceu 108% nos primeiros quatro meses deste ano, sobre igual período do ano passado, atingindo US$490 milhões em receita. O milho também está sendo beneficiado. As vendas externas do grão cresceram 313,5% no primeiro quadrimestre, para US$260 milhões. As culturas da soja - da qual o Brasil é o maior exportador e o segundo maior produtor do planeta - e do algodão são as próximas a sentirem o impacto, segundo a Confederação Nacional da Agricultura (CNA).

Isso ocorre porque os Estados Unidos estão ampliando o uso do milho para produção de etanol, o que eleva seu preço internacional e aquece a procura pelo produto brasileiro. Essa situação é aliada a uma safra recorde de milho no Brasil. Segundo dados divulgados ontem pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o segmento terá o maior crescimento entre as culturas, estimado em 19,2% no ano (de 42,5 milhões de toneladas em 2006 para 50,7 milhões de toneladas).

- A questão energética dos Estados Unidos ainda vai ter impactos por um bom tempo na agricultura brasileira, pois eles têm toda a área agricultável utilizada e qualquer expansão de uma cultura significa redução de outra, como soja e algodão, com forte impacto no mercado mundial - afirmou Antônio Donizetti Beraldo, assessor técnico da CNA.

A entidade alerta que, a longo prazo, isso pode ter efeitos nocivos para a economia brasileira - em última análise, há risco de aumentar o custo da ração para a produção de aves e suínos. Mas, em geral, o país tende a ganhar: seja com o álcool, seja com as outras culturas.

O setor de cana já está em franca expansão. A expectativa do Ministério da Agricultura é que a produção cresça 11,2%, passando a 527,98 milhões de toneladas na próxima safra - 468,15 milhões destinadas ao setor sucroalcooleiro. A área plantada também cresceu 500 mil hectares, para 6,62 milhões (7,4%). Com isso, a produção de álcool passará de 17,4 bilhões de litros para 20,4 bilhões de litros.

PIB agrícola deve crescer 3%, com exportação maior

As outras culturas que tendem a ser prejudicadas nos EUA também estão crescendo no Brasil. A expectativa é que a produção de soja cresça 8,62%, alcançando 58 milhões de toneladas, segundo a Conab. As vendas do grão e seus derivados ao exterior já cresceram 11,3% no primeiro quadrimestre e atingiram US$2,8 bilhões. Até o momento, a quantidade exportada caiu 3,1%, mas os preços acabaram subindo 14,9%. O mesmo ocorre com o algodão, que tende a perder espaço nos EUA. A produção brasileira deve saltar 35,9%, alcançando 2,3 milhões de toneladas este ano.

A expectativa da entidade é que as exportações agropecuárias somem US$55 bilhões este ano, com aumento de 11,3% sobre os US$49,4 bilhões vendidos ao exterior em 2006. Isso deve gerar saldo recorde de US$47,4 bilhões, uma alta de 11% em relação ao ano passado.

Esse aumento das exportações vai se refletir no PIB da agricultura, que deve crescer 3% no ano. Levando em conta só a produção agropecuária (sem insumos e agroindústria), o PIB já se expandiu 1,49% no primeiro trimestre - 1,7% na agricultura e 1,22% na pecuária. O agronegócio em geral subiu 0,7%. A expectativa da CNA é que o valor bruto da produção agropecuária de 2007 chegue a R$197,7 bilhões.

Apesar do bom momento, os produtores reclamam. Segundo a CNA, os preços em dólares dos produtos brasileiros de exportação subiram mais de 12% no último ano. Mas os agricultores afirmam que esse faturamento maior não se traduz em aumento de renda do produtor, pois o preço dos insumos - 60% deles atrelados ao dólar - não cai na mesma velocidade da moeda americana. Isso porque, segundo Ricardo Cotta Ferreira, superintendente técnico da CNA, o mercado hoje é oligopolizado:

- O aumento dos preços internacionais está amenizando o efeito da queda do dólar, mas o produtor está tendo menos renda, pois o custo dos insumos está aumentando.

Mas a Conab tem boas previsões para o setor. Segundo estudo apresentado ontem, a produção de grãos deve crescer 8,1% sobre a colheita de 2005/2006. A soja continua sendo o principal produto agrícola brasileiro. A safra, prevê a Conab, passará de 53,41 milhões de toneladas para 58,02 milhões de toneladas, uma alta de 8,6%.

Sobre os esforços necessários para colocar o Brasil na liderança da produção de etanol, a ministra-chefe da casa Civil, Dilma Rousseff, disse ontem que o país está investindo R$400 milhões no desenvolvimento da segunda geração do combustível, o etanol derivado da celulose, com R$150 milhões da Petrobras.

- E isso tende a ser ampliado, não só com recursos do governo, mas também com mais dinheiro da Petrobras - disse a ministra, lembrando ainda do acordo de cooperação firmado entre Brasil e EUA para o desenvolvimento de novas tecnologias para o etanol.

COLABOROU Ronaldo D"Ercole