Título: Bolívia: Judiciário em greve contra Morales
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Fonte: O Globo, 06/06/2007, O Mundo, p. 37

Juízes param de trabalhar e acusam presidente de atacar a Justiça e tentar implantar regime autoritário.

LA PAZ. Revoltados com o que consideram uma escalada autoritária do presidente Evo Morales, juízes e advogados da Bolívia fizeram uma greve de 24 horas ontem, paralisando o Poder Judiciário do país pela primeira vez em sua história. Não funcionaram ontem a Corte Suprema, o Tribunal Constitucional, o Tribunal Agrário, o Conselho da Judicatura e as Cortes Distritais dos nove departamentos (estados) do país. Não houve nenhum julgamento, em qualquer nível, na Bolívia ontem.

Presidente diz que está certo ao discordar do Judiciário.

Houve poucas exceções à greve. A Procuradoria Geral da República, que é autônoma, funcionou. Da mesma forma, o setor administrativo dos tribunais continuou trabalhando - embora isso não tenha sido suficiente para que eles funcionassem. Um dos quatro integrantes do Conselho da Judicatura (uma espécie de Conselho Nacional de Justiça) também furou a greve, mas, sozinho, não pôde trabalhar.

- Lamentavelmente, o Poder Judiciário chegou à medida extrema de declarar uma paralisação de 24 horas, a primeira e única na história da Justiça, em defesa da independência do Poder Judiciário - disse o decano da Corte Suprema, Jaime Ampuero.

A juíza da Corte Suprema Rosaria Canedo declarou que a ação foi uma resposta a ataques à Justiça realizados por Evo Morales. Segundo ela, os magistrados não permitirão que o presidente faça "mais arremetidas" contra o Poder Judiciário.

- Isso acaba aqui. Somos um Poder do Estado. Que o povo da Bolívia saiba que vamos defender a democracia, a institucionalidade e o respeito à dignidade deste Poder - disse Canedo.

Desde que assumiu o poder em janeiro de 2006, Morales tem feitos acusações ao Judiciário, referindo-se a ele, ironicamente, como "Poder Prejudicial".

Mês passado, as críticas se transformaram numa guerra aberta. O Tribunal Constitucional (TC) afastou quatro juízes da Corte Suprema que haviam sido indicados por decreto por Morales, em dezembro. O presidente acusou o Judiciário de ser o Poder mais corrupto do país.

O TC reconhece que Morales tinha o direito de indicar juízes, pois o Congresso estava em recesso. Mas que, segundo a Constituição, estas nomeações são provisórias e não podem ultrapassar 90 dias. Acusou também Morales de pretender "implantar um regime totalitário".

Em Santa Cruz, onde foi vaiado por oposicionistas, Morales defendeu que o TC poderia só julgar inconstitucional a presença dos juízes indicados por ele para a Corte Suprema, não afastá-los. Ele disse que o fato de a Procuradoria e os setores administrativos não terem aderido à greve dá razão a ele:

- Isso mostra que não estou errado ao questionar o comportamento de alguns juízes.