Título: UnB agora aceita inscrição do 'gêmeo branco'
Autor: Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 07/06/2007, O País, p. 14

Rapaz que foi rejeitado no sistema de cotas, diferentemente do irmão, considerado negro, poderá fazer vestibular.

BRASÍLIA. Após rejeitar a inscrição do estudante Alex Teixeira da Cunha no vestibular pelo sistema de cotas para negros, sob a alegação de que ele não era preto nem pardo, a Universidade de Brasília (UnB) voltou atrás e aceitou ontem a inscrição do rapaz. Alex, de 18 anos, é irmão gêmeo de Alan Teixeira da Cunha, que já tinha sido aprovado para disputar, no sistema de cotas, o próximo vestibular. Embora os dois irmãos sejam gêmeos univitelinos, gerados a partir do mesmo óvulo e com características físicas praticamente iguais, a inscrição de Alan foi aceita de imediato, enquanto a de Alex, não.

O caso pôs em xeque o mecanismo de seleção de cotistas. Primeira universidade federal a adotar o sistema de cotas no país, a UnB reserva 20% das vagas a candidatos que se autodeclararem negros. Nenhum critério socioeconômico é considerado, nem se os inscritos cursaram o ensino médio em escola pública ou particular.

Para evitar fraudes, o Centro de Seleção e de Promoção de Eventos (Cespe), órgão da universidade responsável pelo vestibular, fotografa os inscritos. Uma banca examinadora decide quem é negro ou não. Ao aceitar a inscrição de Alan no vestibular para educação física e rejeitar a de Alex, para o curso de nutrição, a banca surpreendeu os gêmeos. Alex recorreu. Seu argumento foi simples: a inscrição do irmão, com mesma carga genética e características físicas, havia sido aceita. O recurso foi aceito.

- Acho que foi feita justiça. A seleção não deveria ocorrer por fotos, mas em entrevistas - disse Alex.

Os irmãos são filhos de pai negro e mãe branca. Estudaram em escola particular e atualmente fazem pré-vestibular também pago. O pai é gerente do Banco do Brasil, e a mãe, dona-de-casa. Eles vivem numa casa no Cruzeiro Velho, bairro de classe média de Brasília. O pai, Ronaldo, que é formado em contabilidade, diz que buscou trabalhar no serviço público para evitar o racismo no ambiente profissional.

- Não deveria haver cotas para negros e sim para quem tem baixa renda, para as pessoas da escola pública - disse Alex.

O diretor-geral do Cespe, Mauro Rabello, disse ontem que o sistema de seleção poderá ser "aperfeiçoado", mas não há nada decidido ainda. Ele lembrou que já foram realizados seis vestibulares para cotistas, desde o segundo semestre de 2004:

- As cotas são uma decisão que a universidade tomou há quatro anos. Acredito que o que possa ser feito é algum tipo de aperfeiçoamento. São muitas fotos analisadas no mesmo dia. A recomendação à banca é que, na dúvida, encaminhe à fase seguinte.

Segundo ele, caso semelhante ocorreu em 2005, envolvendo também duas irmãs gêmeas. O problema foi corrigido, após recurso.

As provas do próximo vestibular serão aplicadas em 16 e 17 de junho. Das 2.094 vagas, 413 em todos os cursos, inclusive os mais disputados, como medicina e direito, são reservadas aos cotistas. A exemplo dos demais candidatos, eles devem atingir uma nota mínima no teste. A diferença é que concorrem apenas entre si, o que tende a reduzir a nota para obter a vaga.

Do total de 22.901 inscritos, 2.263 vão concorrer pelo sistema de cotas. Inicialmente, 3.791 candidatos inscreveram-se no vestibular para cotistas, mas 1.551 foram rejeitados, entre eles Alex. O Cespe recebeu 69 recursos, dos quais somente 23 foram acatados. No caso de Alex e de outros quatro candidatos, bastou a justificativa por escrito. Os demais precisaram passar por entrevista individual.

O reitor da UnB, Timothy Mulholland, divulgou nota reafirmando a disposição de manter as cotas para negros, ressalvando que a instituição poderá aperfeiçoar o sistema, incluindo a seleção dos inscritos. Ele argumenta que a possibilidade de recurso é prevista no vestibular, e que as inscrições só terminam após a análise de todos os pedidos de revisão. "O que a Universidade de Brasília não abre mão é de buscar políticas e ações que contribuam para diminuir a exclusão social na região e no País e para a igualdade de todos no gozo dos direitos da cidadania", diz a nota.