Título: Marcha por liberdade em Caracas
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Fonte: O Globo, 07/06/2007, O Mundo, p. 34

Estudantes protestam contra fim da RCTV. Chávez clama vitória sobre EUA.

Dezenas de milhares de estudantes, acompanhados por reitores e professores, saíram ontem às ruas da capital venezuelana e de pelo menos outras três cidades para exigir o respeito à autonomia das universidades e protestar contra a saída do ar da Radio Caracas Televisión (RCTV), a mais antiga emissora privada do país, numa das maiores manifestações desde que a emissora saiu do ar, no dia 27 de maio. Aos gritos de "Aqui estão os estudantes que querem liberdade" e "A CIA não me paga", os manifestantes da Marcha Nacional das Universidades cruzaram as ruas da capital até a Procuradoria Geral da República.

Convocados pelo grêmio de reitores, docentes e estudantes das universidades públicas e privadas, os manifestantes partiram da Praça Reitoria da Universidade Central da Venezuela com apitos, bandeiras e cartazes, por volta das 11h, apesar das restrições iniciais à entrada em Caracas dos ônibus trazendo estudantes de outras cidades e estados. Eles seguiram até a Procuradoria, onde o procurador geral da República, Isaías Rodríguez, recebeu um documento que pede respeito à autonomia das universidades, a reabertura da RCTV e a libertação dos detidos nas manifestações.

- Queremos que nos escutem, que o canal fechado seja reaberto, que nenhum outro meio (de comunicação) seja fechado - disse o estudante Eduardo Torres, da UCV.

Ao longo do caminho, centenas de pessoas colocaram bandeiras nas janelas dos edifícios, enquanto outras saudavam os manifestantes das portas de casas e escritórios.

A RCTV, emissora opositora com 53 anos de existência, saiu do ar à meia-noite do dia 27, acusada de golpismo pelo presidente Hugo Chávez, que decidiu não renovar a concessão.

Os estudantes também pediram que seja respeitada a "educação pluralista". Críticos do governo afirmam que a nova lei de educação que Chávez pretende promulgar passaria pelo fim da autonomia das universidades e incluiria valores socialistas.

Ontem à noite, os estudantes iriam decidir se aceitam o convite para comparecer hoje à Assembléia Nacional. Eles haviam pedido o direito à palavra ao Congresso para responder às acusações de que estariam sendo manipulados pela oposição. Os parlamentares propuseram, então, chamar também estudantes pró-Chávez.

- Solicitamos um direito de réplica e nos oferecem um debate - criticou Stalin González, líder estudantil da UCV.

Pouco antes da passeata, uma bomba de fabricação artesanal explodiu na Escola de Comunicação Social da UCV, causando danos materiais. Outro explosivo colocado na mesma universidade não foi detonado. Para as autoridades universitárias, foi uma tentativa de amedrontar os estudantes.

Funcionário de TV denuncia ameaças

No fim da noite de terça-feira, a Venezuela conseguiu uma vitória ao manter sua vaga na Comissão de Direitos Humanos da OEA, no que Chávez definiu como uma derrota para os EUA, que vinham fazendo campanha pela Bolívia. Um dia antes, na Assembléia Geral da organização, no Panamá, houve uma discussão entre a secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, e o chanceler venezuelano, Nicolás Maduro, em que trocaram farpas sobre o caso da RCTV e a prisão de Guantánamo.

- Condoleezza se perturbou, agiu como um raio e saiu. Esses são os sinais da decadência imperial, de uma grande derrota para o império - disse Chávez ontem.

Condoleezza havia proposto uma missão da OEA para investigar o caso da RCTV. Chávez também afirmou que a Venezuela é vítima de "tentativa de golpe suave" ao se referir às manifestações, mas disse ser um "golpe de chama curta":

- Há um livreto que mostra todos os passos, como pintar as mãos de branco, por exemplo.

Em Lima, o gerente de imprensa da RCTV, Miguel Ángel Rodríguez, denunciou ontem que ele e sua família, assim como meios de comunicação de oposição, como a TV Globovisión, vêm recebendo ameaças e alertou sobre uma onda repressiva no país.

- Pedi que isso seja investigado, mas não fui ouvido pelo Estado - disse. - Há ameaças de morte.