Título: Operação navalha na CPI
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 08/06/2007, O País, p. 3

Governo e oposição operam para enterrar investigação sobre escândalo da Gautama.

Nos últimos dias, foi deflagrado um jogo pesado nos bastidores para enterrar definitivamente a CPI da Navalha. Com o temor de que a CPI não se limite ao empreiteiro Zuleido Veras, da Gautama, e comece a investigar a relação de políticos com empreiteiros, grupos distintos passaram a agir com força para reverter a instalação da CPI mista do Congresso, que até o início da semana contava com 172 assinaturas na Câmara e 29 no Senado.

A intervenção mais pesada do governo se deu na quarta-feira, quando seria protocolado o requerimento de criação da CPI, levando ao adiamento com a notícia de que um grupo retiraria as assinaturas. O anúncio de uma série de nomeações de cargos reivindicados, principalmente do PMDB, no Banco do Brasil e na Caixa Econômica Federal, não foi visto como mera coincidência.

Para barrar a CPI, atuam com o mesmo objetivo o Palácio do Planalto, setores da oposição e até mesmo parlamentares da chamada bancada das empreiteiras. O governo chegou a reabrir na semana passada a negociação do segundo escalão para acalmar aliados. Grupos de deputados já estavam chantageando o Planalto, e ameaçavam assinar o requerimento de CPI.

Depois de mapear a situação no Congresso e conter os focos de insatisfação, no núcleo do governo o clima era de confiança.

- Esse assunto já é página virada. Estou conversando com deputados e ninguém mais fala em CPI - disse o ministro das Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia.

O golpe final será dado no início da semana que vem. Assim que a CPI for protocolada na secretaria-geral da Mesa, um grupo de cerca de 15 deputados já negociou retirar suas assinaturas do requerimento, o que deve inviabilizar a instalação da comissão de inquérito. A estratégia inclui, até mesmo, assinaturas de deputados que já acertaram antecipadamente a retirada dos nomes para confundir a minoria.

- Posso garantir que não vai haver CPI da Navalha. Pelo menos 15 deputados já garantiram que vão retirar seus nomes. Se preciso, vamos conseguir mais nomes - disse o vice-líder do PT, Maurício Rands (PE).

Deputados sofrem pressão de líderes

O governo já identificou partidos e estados onde ocorrerão as primeiras baixas do que já foi apelidada no Planalto de "natimorta CPI da Navalha". O PSB será um dos principais alvos, já que 14 dos 28 deputados da bancada assinaram o requerimento. Foi acionado até mesmo o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), para retirar o assinatura do deputado Gonzaga Patriota (PSB-PE). A pressão também é grande em torno do deputado Ribamar Alves (PSB-MA).

No PDT, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, foi acionado para retirar o nome de pelo menos metade dos dez deputados do partido que já assinaram a CPI. No PP, o líder Mário Negromonte (BA) já acertou a retirada de assinaturas dos deputados Vadão Gomes (PP-SP) e Waldir Maranhão (PP-MA).

Outra frente foi aberta pelo deputado João Leão (PP-BA), da bancada das empreiteiras. Ele tem abordado vários deputados, principalmente os que estão recolhendo assinaturas. Vários não escondem o constrangimento com a atuação dele, que costuma ser enfático em suas abordagens:

- Por que você está mexendo com isso? Pára com isso!

Na bancada do Maranhão, passou a correr um fato inédito: tanto o grupo da família Sarney como o grupo do governador Jackson Lago (PDT) passaram a agir para retirar assinaturas.

No DEM, mesmo com a determinação do comando partidário, as bancadas de Bahia, Sergipe, Piauí e Maranhão não assinaram o requerimento, justamente em estados em que nomes do partido aparecem envolvidos na Operação Navalha. Com a citação do nome do sobrinho do senador Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA), deputado Paulo Magalhães (DEM-BA), só três deputados descumpriram a determinação de não assinar a CPI.

- Decidimos que a melhor opção era não assinar a CPI - explicou o deputado ACM Neto (DEM-BA), sem esconder o constrangimento.

No PMDB, a pressão foi ainda maior e chegou irritar o Planalto. Um grupo de deputados da bancada do Rio, com o apoio de outros deputados, tentou barganhar assinaturas para forçar a nomeação de Luiz Paulo Conde para a presidência de Furnas. Os deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Carlos Willian (PTC-MG) e Wladimir Costa (PMDB-PA) pediram uma folha em separado para coletar assinaturas ao deputado Júlio Delgado (PSB-MG), um dos coordenadores do grupo que tenta instalar a CPI. Ao perceber que esse grupo estava tentando barganhar cargos com o Planalto, Delgado reagiu:

- Não vou aceitar a negociação com o governo através da CPI. Isso aqui não é para fazer barganha!

Mas, na semana passada, o Planalto começou a emitir sinais de que vai abrir a negociação com o PMDB e outros partidos para tranqüilizar a base. O principal recado foram as nomeações políticas de dois peemedebistas: do ex-senador Maguito Vilela (PMDB-GO) para a vice-presidência de governo do Banco do Brasil e do ex-deputado Moreira Franco (PMDB-RJ) para uma vice-presidência da CEF.

- Não há relação entre cargos e CPI. Se encontro alguém que assinou o requerimento, peço para retirar o nome, mas peço pelos meus cinco mandatos e não como líder. Essa CPI cria desgosto para o Legislativo. Só interessa para alguns que gostam de ver as vísceras do Congresso - disse o líder do governo na Câmara, deputado José Múcio Monteiro (PTB-PE).