Título: Meta longa, adesão parcial
Autor: Magalhães-Ruther, Graça e Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 08/06/2007, Economia, p. 21

EUA e Rússia não assumem compromisso do G-8 de reduzir emissões em 50% até 2050.

Depois de dura negociação, os países do G-8 chegaram ontem a um compromisso sobre a redução das emissões de gases para controlar o aquecimento global. O acordo foi obtido no último momento, para evitar um fracasso das discussões sobre o principal tema da cúpula do G-8 (grupo dos sete países mais ricos do mundo mais a Rússia), que termina hoje no balneário alemão de Heiligendamm. O compromisso, definido pela chanceler alemã e atual presidente do G-8, Angela Merkel, como um "grande progresso", prevê uma redução das emissões em 50% até 2050. Mas apenas Canadá, Japão e os países da União Européia (UE) assumem a obrigatoriedade de redução. Estados Unidos e Rússia vêem a meta como "seriamente considerável", mas não assumiram um compromisso. Além disso, foram abertas as negociações para o acordo que deverá suceder o Protocolo de Kioto na conferência de Bali, no fim deste ano.

Merkel admitiu que o resultado ficou aquém do ambicionado, mas, ainda assim, foi "um grande passo adiante". Ela se referia à recusa inicial dos EUA em fixar qualquer meta de redução das emissões.

Para Lula, acordo é "não fazer nada"

Já o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demoliu o acordo. Para Lula, um compromisso fora do Protocolo de Kioto, que fixa metas de redução para 2012, é o mesmo que nada.

- Abrir mão do protocolo de Kioto pensando que uma reunião voluntarista de chefes de Estado, em que ninguém assume compromissos para época nenhuma, em que ninguém diz o que vai fazer e que fica pela vontade de cada um, significa não fazer nada - disse Lula em Berlim, antes de partir para Heiligendamm, onde participa hoje da reunião do G-8 como convidado.

Para Merkel, é importante que Washington tenha admitido negociar a questão do clima no âmbito da ONU. Seu objetivo é incluir os emergentes, como Brasil, China e Índia, num compromisso de redução das emissões.

Mas Lula disse que os países precisam assumir compromissos num tempo bem mais curto. E insistiu na necessidade de os ricos cumprirem o Protocolo de Kioto.

- É um tempo muito largo e que vai fazer com que aqueles que estão poluindo continuem poluindo e não façam nada. Daqui a 50 anos vai passar tanta água embaixo da ponte e vai haver tantas revoluções tecnológicas, que essa decisão estará superada. O importante é saber o que vamos fazer até 2012, até 2015 ou até o próximo ano - insistiu Lula, para quem a meta de 2050 "significa que muita gente não vai fazer nada até 2049".

Para Daniel Mittler, do Greenpeace, o compromisso é "muito pouco". O sociólogo Ulrich Beck lembrou que o aquecimento global é um exemplo de como os países ricos prejudicam os pobres com seu consumo e seu modelo econômico. Por isso, afirmou, os ricos têm de assumir a obrigação de combater esses efeitos. Peter Wahl, o iniciador da "cúpula alternativa", encerrada ontem, previu "uma vida curta" para o G-8, afirmando que a quantidade de protestos foi inédita para uma cúpula não-armamentista.

Mas Yvo de Boer, secretário-geral da Convenção da ONU sobre Mudança Climática (UNFCCC, na sigla em inglês), vê sinais positivos para os países em desenvolvimento:

- Agora há uma necessidade de engajamento dessas economias.

Lula não poupou críticas a George W. Bush, que se recusa a ratificar o Protocolo de Kioto. Uma das queixas dos EUA é que o protocolo não obriga países emergentes como Brasil, Índia e China a reduzirem suas emissões. Bush surpreendeu o mundo ao revelar, uma semana antes da cúpula, sua própria estratégia, que prevê que os 15 países mais poluentes do mundo, incluindo o Brasil, estabeleçam metas de redução até 2008.

Lula reconhece que o fato de Bush aceitar hoje discutir o assunto "é um avanço". Ele brincou, dizendo que Bush talvez tenha mudado de idéia por causa do filme-denúncia de Al Gore, "Uma verdade inconveniente". Lula também criticou a idéia de que os emergentes tenham de se comprometer com a redução das emissões e defendeu a posição adotada pelo Brasil na conferência da ONU sobre meio ambiente no Rio, em 1992: que os países ricos, responsáveis por 60% das emissões de gases do planeta, paguem a maior parte da conta agora:

- Os países em desenvolvimento e os mais pobres têm o direito de crescer como eles (os ricos) cresceram e de ter a mesma qualidade de vida que eles conquistaram. Aceitar a idéia de que os países em desenvolvimento e os pobres é que têm de fazer sacrifícios, nós não aceitamos!

Lula disse que qualquer discussão com o Brasil sobre mudança do clima tem de passar pelos biocombustíveis, que não apenas são uma resposta ao aquecimento global como vão gerar emprego. E rebateu as críticas européias de que o biodiesel estaria provocando desmatamento na Amazônia, lembrando que este foi reduzido em 52% em dois anos.

G-8 QUER REFORÇAR LAÇOS COM EMERGENTES, na página 22